Pesquisas mostram que os negros estão em desvantagem
em relação aos brancos em âmbito geral:
na infra-estrutura urbana e habitação, no acesso
à educação e justiça, no mercado
de trabalho e na distribuição de renda.
Desigualdades
Raciais no Brasil
Escritório
Nacional "Zumbi dos Palmares"
Consultoria Rosana Heringer
Critérios
de classificação racial e distribuição
da população brasileira segundo cor/raça
O
Censo brasileiro pede às pessoas que se classifiquem
dentro de uma das cinco categorias seguintes: branco, preto,
pardo, indígena ou amarelo (oriental). Segundo dados
do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)
de 1996, pretos e pardos constituem 45% de toda a população
e 98,7% da população não branca.
A fim de aperfeiçoar, no censo do ano 2000, as opções
de classificação contidas no quesito cor/raça,
o IBGE realizou um pré-teste em 1998 junto a uma amostra
de 90 mil pessoas em seis áreas metropolitanas do País.
Neste teste foi incluída uma pergunta sobre a origem
dos entrevistados ("Qual a origem que o (a) senhor (a)
considera ter?"). Tanto nas respostas à pergunta
aberta quanto à formulação fechada, a
opção "origem brasileira" foi escolhida
pela grande maioria dos entrevistados (85,7% e 86,6%, respectivamente).
A partir deste pré-teste, a comissão consultativa
do Censo 2000 recomendou ao IBGE manter as mesmas cinco categorias
utilizadas atualmente (Schwartzman, 1999).
A distribuição regional de brancos e negros
apresenta-se bastante diferenciada, com grande concentração
da população afro-brasileira nas regiões
Nordeste e Norte. O Sul do País possui população
majoritariamente branca e a região Centro-Oeste apresenta
uma distribuição equilibrada entre brancos e
negros, similar à distribuição nacional.
O fato de a população negra estar concentrada
principalmente nas regiões mais pobres do País
já indica que a mesma encontra-se mais vulnerável
no que diz respeito às condições de vida
e ao acesso a serviços básicos. As informações
que poderiam nos fornecer esta caracterização
são escassas. Entretanto, alguns indicadores revelam
que a população negra no Brasil vivencia condições
mais precárias na sua luta pela sobrevivência.
Pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de
1996 podemos observar também que as taxas de mortalidade
infantil das crianças até um ano de vida e entre
crianças menores de cinco anos são maiores na
população negra. Esta situação
se acentua na região Nordeste, onde a taxa de mortalidade
de crianças negras até cinco anos é de
102,1 por mil nascidos vivos. A desigualdade, entretanto,
não se restringe ao Nordeste, já que as taxas
de mortalidade infantil das crianças negras no Sudeste
também são maiores do que a das brancas (25,1
e 43,1 mortalidade infantil; 30,9 e 52,7 mortalidade
de menores de 5 anos de idade, respectivamente).
Infra-estrutura
urbana e habitação
É
de conhecimento geral a estreita relação entre
as condições de saúde e o acesso à
infra-estrutura básica em termos de serviços
públicos tais como saneamento básico, coleta
de lixo e acesso à eletricidade, entre outros.
Também pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
de 1996 podemos ver que brancos e negros no Brasil têm
acesso desigual a estes serviços. No que diz respeito
à rede de esgoto, por exemplo, apenas metade dos negros
tem acesso a ele, enquanto 73,6% dos brancos o possuem.
Outros indicadores de condições de vida e acesso
a serviços disponíveis para o ano de 1987 revelam
mais aspectos de desigualdades entre negros e brancos no que
diz respeito à infra-estrutura urbana. O percentual
da população que vivia em barracos, predominantes
em favelas, era de 3.4 para os brancos, 13.9 para os pretos
e 13.3 para os pardos em 1987. No mesmo ano, o percentual
da população que vivia em bairros sem coleta
de lixo era de 18.3 para brancos, 34.1 para pretos e 39.5
para pardos. A porcentagem das pessoas que viviam em domicílios
sem eletricidade era de 10.2 para brancos, 21.7 para pretos
e 28.0 para pardos.
Ainda que este quadro tenha melhorado para o conjunto do País
ao longo da década, as diferenças entre negros
e brancos permanecem.
Baseados nesses e em outros dados, os pesquisadores Wânia
Santanna e Marcelo Paixão utilizaram o Índice
de Desenvolvimento Humano (IDH), usado pelo Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), para calcular a qualidade
de vida relativa da população afro-brasileira
(pretos e pardos). O IDH do conjunto da população
brasileira era de 0.796 (para um máximo de 1.000).
Para os afro-brasileiros, o IDH era 0.573.
"O
IDH para os afro-brasileiros é pior do que o dos países
latino-americanos, exceto Nicarágua, que vêm
logo atrás com 0.568. (...) Uma triste situação
para o paraíso da democracia racial..." (Santanna
& Paixão, 1997:33).
Acesso
à educação
Uma primeira constatação sobre o acesso à
educação (com base na Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios de 1996) é a baixa escolaridade
da população brasileira como um todo, já
que a média do País é de apenas 5,3 anos
de estudo. Supondo que não haja repetência, isto
equivaleria apenas à conclusão da 5ª série
do ensino básico.
Um outro aspecto a se levar em conta é a diferença
em termos de anos de estudo entre negros e brancos. Estes
últimos possuem em média dois anos de estudo
a mais que os negros.
Se compararmos a situação dos anos de estudo
efetivamente cursados pelas pessoas de 15 anos ou mais entre
1988 e 1996 verificamos que houve um aumento da escolaridade
dos brasileiros no período. Entretanto, esta ampliação
do acesso à escola não se traduziu numa diminuição
das desigualdades raciais, já que a proporção
de negros entre as pessoas com 12 anos ou mais de estudo (equivalente
aos que concluíram o ensino médio e possuem
curso superior) é de apenas 2,8%, quase quatro vezes
menos do que os brancos na mesma faixa (10,9%).
Por outro lado, a proporção de negros entre
aqueles sem instrução ou com menos de um ano
de estudo continua em 1996 a ser mais do dobro da proporção
de brancos nesta faixa.
Dados de pesquisas realizadas especificamente sobre a situação
educacional da população negra indicam que,
mesmo quando se controla o valor do rendimento familiar per
capita, "a taxa de escolarização de negros
é inferior a dos brancos; os brancos apresentam uma
porcentagem maior de crianças sem atraso escolar; e
maior proporção de alunos negros freqüenta
escolas que oferecem cursos com menor número de horas
de aula" (ROSEMBERG, 1986; HASENBALG & SILVA, 1990).
Este quadro geral da situação educacional dos
negros no Brasil representa uma das principais dificuldades
a serem enfrentadas a fim de gerar maior igualdade de oportunidades
entre brancos e negros no país. Atenta a este cenário,
a presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais INEP, ligado ao Ministério da Educação,
afirmou em artigo recente que "a população
negra continua apresentando um nível de escolaridade
mais baixo. Esta é uma das prioridades para uma política
de equidade e integração socioeconômicas
que requer uma ação mais afirmativa do poder
público e da sociedade." (CASTRO, 1998:8-9).
Mercado
de trabalho e distribuição de renda
"Mais
de um século depois da abolição da escravidão,
o trabalho manual continua a ser o lugar reservado para os
afro-brasileiros. Em oposição ao que afirmaram
as teorias sobre modernização, a estrutura de
transição fornecida pelo rápido crescimento
econômico nas últimas décadas não
parece ter contribuído para diminuir de maneira significativa
à distância existente entre os grupos raciais
presentes na população"(Hasenbalg, 1996:15).
Os negros brasileiros têm feito pouco progresso na conquista
de profissões de maior prestígio social, no
estabelecimento de seus próprios negócios e
na ocupação de posições de poder
político. Eles ainda concentram-se em atividades manuais
que exigem pouca qualificação e escolaridade
formal. As desvantagens acumuladas através da história
brasileira tornaram o sucesso difícil para a população
afro-brasileira.
Informações recentes, obtidas a partir de pesquisa
específica realizada em seis regiões metropolitanas
do País indicam que a desigualdade racial está
presente nos mais variados indicadores associados ao desempenho
de brancos e negros no mercado de trabalho.
Na região metropolitana de São Paulo, a maior
cidade brasileira, a taxa de desemprego entre os homens negros
é de 20,9%, enquanto esta taxa é de 13,8% entre
os brancos (INSPIR et alli, 1999: 29).
O valor do salário médio diário de negros
e brancos também revela grandes disparidades. Em São
Paulo, os negros ganham em média R$2,94 por dia, enquanto
os brancos recebem R$ 5,50 (INSPIR et alli, 1999:39).
Como afirma o relatório sobre desigualdades raciais
no mercado de trabalho, "é preciso que o Estado
invista em políticas públicas e implemente de
fato a Convenção 111 da OIT, invertendo a lógica
da estrutura de oportunidades, que está profundamente
marcada por práticas violadoras de direitos e de discriminações
baseadas na raça e no sexo".(Inspir et alli, 1999:
8).
A pesquisa revela que apenas 1,9% dos negros ocupados em São
Paulo são empregadores, em comparação
aos 7,2% de brancos nesta posição, enquanto
mais da metade das mulheres negras (56,3%) estão ocupadas
como domésticas ou mensalistas (INSPIR et alli, 1999).
No que diz respeito à distribuição dos
ocupados por grupos de ocupação, os dados demonstram
que apenas 5,9% dos negros ocupam cargos de direção
e planejamento, enquanto 21,4% dos brancos encontram-se nesta
posição. O mesmo ocorre em relação
aos cargos de gerência (3,6% e 11,7, respectivamente)
e planejamento (2,3% e 9,7%) (INSPIR et alli, 1999).
O quadro de desigualdade entre negros e brancos está
relacionado tanto a fatores estruturais quanto à discriminação.
Entre os fatores estruturais, sem dúvida o mais significativo
é o componente educacional. Ao se situarem nos grupos
com menor acesso à educação formal, os
negros também ocupam postos de menor prestígio
no mercado de trabalho.
A Pesquisa de Emprego e Desemprego elaborada pelo Dieese em
convênio com o Seade demonstra que, em 1998, enquanto
32,8% dos brancos ocupados na Região Metropolitana
de São Paulo possuíam escolaridade até
o 1º grau incompleto (ensino fundamental), cerca de 54%
dos negros estavam nesta posição. A situação
se inverte quando analisamos a faixa equivalente ao ensino
médio e ao ensino superior. Neste último grupo
a proporção de brancos equivale a quase cinco
vezes a dos negros.
No que diz respeito ao rendimento, negros e brancos também
possuem situações desiguais. Ainda no caso da
Região Metropolitana de São Paulo, esta mesma
pesquisa revela que apenas 5,3% dos negros ocupados recebem
mais de 10 salários mínimos.
Este fato poderia ser interpretado e em muitos casos
o é como decorrente somente do menor grau de
instrução dos negros. Entretanto, o estudo revela
o contrário, ao mostrar que, mesmo quando se encontram
em iguais condições de escolaridade, negros
e brancos possuem rendimentos diferenciados. Esta situação
se agrava principalmente nos grupos com grau de instrução
mais elevado. Tal fato pode ser atribuído à
ausência, entre os negros, de redes pessoais que permitam
maior acesso a melhores oportunidades de emprego. Também
pode ser atribuído à sub-remuneração
e à sub-utilização de mão-de-obra
negra qualificada, decorrente da discriminação
racial.
Este quadro apresentado para a Região Metropolitana
de São Paulo não se constitui num caso isolado.
Ao contrário, reproduz-se em todo o país, provavelmente
de formas mais acentuadas em regiões com menor circulação
de riqueza e atividade econômica menos dinâmica.
Alguns indicadores de renda ajudam-nos a analisar este quadro
para o conjunto do país. Utilizando dados da PNAD (Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios) 1996, LIMA (1999)
apresenta a distribuição de renda da População
Economicamente Ativa (PEA) brasileira segundo quartis. Esta
divisão permite-nos identificar quantas pessoas encontram-se
entre os 25% com menor rendimento (Quartil 1), nos 25% imediatamente
seguintes (Quartil 2), nos 25% seguintes (Quartil 3) e, finalmente,
nos 25% onde se encontra a parcela com maiores rendimentos
(Quartil 4).
Negros e brancos encontram-se inversamente representados nos
extremos (25% mais pobres Quartil 1; e 25% mais ricos
Quartil 4). Esta situação permaneceu
praticamente inalterada entre 1988 e 1996. Cerca de 60% dos
negros encontram-se concentrados nos dois primeiros quartis,
enquanto 40% dos brancos encontram-se neste grupo. Há
uma convergência entre a renda de brancos e negros na
faixa intermediária e, no Quartil 4, de renda mais
alta, ocorre a inversão: o número de brancos
(32,2%) é o dobro do dos pretos (14,1%) e dos pardos
(14,5%).
Vale a pena observar a desigualdade entre brancos e negros
no que diz respeito à mobilidade ocupacional entre
gerações, isto é, a situação
ocupacional do indivíduo em relação à
ocupação do pai. Hasenbalg e Silva (1999) demonstram
que "os brancos têm uma vantagem significativa
em termos de mobilidade ocupacional ascendente; pouco mais
da metade deles (52,5%) encontram-se em grupos ocupacionais
mais elevados que os de seus pais, ao passo que isso ocorre
com somente 43,9% dos pardos e 45,5% dos pretos" (pág.
223). Estes autores concluem que "os grupos não-brancos
estão sujeitos a um processo de cumulação
de desvantagens ao longo de suas trajetórias
sociais" (pág. 218).
Vitimização
e acesso à justiça
Nas grandes cidades brasileiras, principalmente nos bairros
mais pobres e favelas, é comum a existência de
quadrilhas organizadas que controlam a distribuição
e venda de drogas ilegais, principalmente maconha, cocaína
e crack, consumida geralmente por integrantes dos setores
médios e altos da sociedade. Este comércio ilegal
movimenta altas cifras e emprega vários adolescentes
e jovens que identificam aí uma oportunidade de ganhar
muito mais do que o salário que conseguiriam receber
em alguma ocupação legal. O controle por pontos
de venda de drogas nas cidades e o enfrentamento com a polícia
tornam esta atividade geradora de grande violência e
insegurança nas cidades, o que a faz responsável
por altíssimos índices de homicídio entre
jovens pobres nas grandes cidades brasileiras.
Sabe-se que apenas um pequeno número de adolescentes
e jovens dos setores populares no Brasil envolvem-se em atividades
relacionadas ao tráfico de drogas e em outras atividades
criminosas. Isto não impede, entretanto, que a sociedade
identifique grande parte dos jovens pobres, e moradores de
bairros de periferia e favelas como potencialmente perigosos
e termine por tratá-los como tal. Esta é uma
das situações em que o preconceito racial se
expressa de maneira mais visível no Brasil: os jovens
negros e pobres são desproporcionalmente mais identificados
como fonte de ameaça e insegurança para a população
do que os jovens brancos pobres. Nestas situações
a cor funciona como uma agravante no estabelecimento dos critérios
de definição dos suspeitos, seja por parte da
população ou da própria polícia,
em situações como batidas e revistas policiais.
PAIXÃO (1982), ao pesquisar quais eram os esteriótipos
do suspeito ou do criminoso identificados por policiais militares
em Belo Horizonte (MG), observou que a cor da pele foi um
dos principais fatores identificados. Zaluar (1989) também
desenvolveu pesquisas que apontam que as características
da atuação policial contribuem para que os negros
sejam alvo preferencial do policiamento repressivo.
Esta maior desconfiança em relação aos
negros como agentes de violência ganhou melhores contornos
através de pesquisas realizadas pelo Datafolha e pelo
ILANUD (Instituto Latino-Americano das Nações
Unidas para a Prevenção ao Delito e Tratamento
do Delinqüente), respectivamente em 1995 e 1997. Ambos
trabalhos buscaram investigar a imagem da polícia entre
os moradores de São Paulo e Rio de Janeiro. Assim analisa
o cientista político Túlio Kahn:
"Se
a opinião da maioria das pessoas não é
favorável à forma de atuação das
polícias, existe um grupo cuja opinião é
particularmente desfavorável e este é o grupo
dos "não-brancos". Os motivos desta desconfiança
estão baseados em grande medida na experiência
própria ou no conhecimento do trato das forças
policiais com relação aos negros e mulatos."
(Kahn, 1998: 2).
A pesquisa realizada em 1995 aponta que as críticas
dos brancos em relação à polícia
concentraram-se em aspectos como ineficiência e corrupção,
enquanto os negros criticaram com mais freqüência
a atuação violenta da polícia: 20% dos
negros afirmaram sentir medo da polícia, em contraste
com 11% dos brancos. Além disso, entre os negros foi
maior o número de entrevistados que revelaram ter mais
medo da polícia do que dos bandidos.
Estas pesquisas revelam também que quase metade dos
negros (47%) entrevistados em 1995 disseram Ter sido abordados
pela polícia pelo menos uma vez, em comparação
com 34% dos brancos. Os resultados foram semelhantes em 1997.
Kahn aponta que "dos negros, 24% disseram que já
foram parados e ou mais vezes [pela polícia]"
(KAHN, 1998: 4).
Túlio Kahn afirma também que, após ter
realizado diversas pesquisas sobre a atuação
policial em relação aos negros, pode concluir
que a violência é um dos principais dramas enfrentados
atualmente pela população negra no Brasil.
Uma pesquisa realizada por Adorno (1995) em São Paulo
ajuda a ilustrar mais claramente as dificuldades enfrentadas
pelos negros numa outra fase do sistema de segurança
pública e administração da justiça,
quando encontram-se como réus no âmbito da justiça
criminal. O objetivo deste estudo foi identificar, caracterizar
e explicar as causas do acesso diferencial de brancos e negros
à justiça criminal, através da análise
das sentenças judiciais para crimes da mesma natureza
praticados por negros e brancos. A pesquisa indica que "brancos
e negros cometem crimes violentos em iguais proporções,
mas os réus negros tendem a ser mais perseguidos pela
vigilância policial, enfrentam maiores obstáculos
de acesso à justiça criminal e revelam maiores
dificuldades de usufruir do direito de ampla defesa assegurado
pelas normas constitucionais." (ADORNO, 1995:45).
Em função destas ocorrências, o estudo
conclui que os negros tendem a receber um tratamento penal
mais rigoroso, com maior probabiblidade de serem punidos do
que os brancos. O autor afirma que, "por conseguinte,
a cor é poderoso instrumento de discriminação
na distribuição da justiça" (Ibidem).
A pesquisa de Adorno indica uma maior incidência de
prisões em flagrante para réus negros em comparação
aos brancos, assim como um maior número de réus
brancos em liberdade. Além disso, o trabalho mostra
que os réus negros utilizam com mais freqüência
do que os brancos os serviços da defensoria pública
e da defensoria dativa (advogados particulares pagos pelo
Estado), ambas em geral designadas para réus que não
possuem recursos para contratar sua própria defesa.
A defensoria pública em geral, incluindo a dativa,
encontra-se sobrecarregada de trabalho e nem sempre consegue
oferecer um serviço de qualidade ao réu, valendo-se
muitas vezes de procedimentos meramente burocráticos
e não estabelecendo uma relação de proximidade
com o cliente. Estas características do serviço
da defensoria levam a crer que há uma maior predisposição
dos réus que fazem uso deste serviço serem condenados.
(ADORNO, 1995: 56-57).
Em relação ao desfecho processual e segundo
o fato de terem ou não apresentado provas testemunhais
ao longo do processo, a análise de Adorno mostra que
os brancos foram mais beneficiados pelo uso deste direito
no que diz respeito às chances de absolvição.
"Entre os réus negros que deixaram de exercer
aquele direito (isto é, não arrolaram testemunhas),
30,0% foram absolvidos e 70,0% condenados; entre os réus
brancos que se valeram desse direito, o quadro muda substantivamente
(...): 48,8% foram absolvidos e 52,0% condenados. Em outras
palavras, aumenta, para os réus brancos, a probabilidade
de absolvição com o exercício deste direito."
(ADORNO, 1995:62).
Além disso, se analisamos a população
carcerária do País, verificamos que os negros
encontram-se numa proporção maior do que a sua
representação na população, enquanto
ocorre o inverso em relação aos brancos. Dados
recentes disponíveis para o Estado de São Paulo
indicam que a taxa de encarceramento "é de 76,8
por 100 mil habitantes para os brancos e de 140 por 100 mil
para pardos, elevando-se para 421 por 100 mil para negros.
A probabilidade de um negro estar na prisão é
portanto de 5,4 vezes maior do que a de um branco e 3 vezes
maior que a de um pardo." (Kahn, 1999:1)
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