A Comissão Pastoral da Terra registrou 61 assassinatos
de trabalhadores rurais, no período de janeiro a outubro
de 2003. Entre 1985 e 2002, foram registrados 1.280 assassinatos
de trabalhadores rurais, advogados, técnicos, lideranças
religiosas e sindicais ligados à luta pela terra. Desse
total, somente 121 foram levados a julgamento. Entre os mandantes
dos crimes, apenas 14 foram julgados, sendo sete condenados.
Foram levados a julgamento quatro intermediários, sendo
dois condenados. Entre os 96 executores julgados, 58 foram
condenados.
Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, Comissão
Pastoral da Terra, Centro de Direitos Humanos Evandro Lins
e Silva e Instituto Carioca de Criminologia
Crimes do Latifúndio
A história de violência no campo no Brasil é
causada pela enorme concentração fundiária.
Embora a reforma agrária seja reconhecida como uma
medida justa e necessária por especialistas e pelo
povo brasileiro, existe, atualmente, uma campanha por parte
de conservadores que tentam impedir sua implementação.
Nota divulgada recentemente pela Comissão Pastoral
da Terra (CPT) denuncia que "as elites latifundiárias
de nosso país (...) buscam de toda forma criar um clima
de instabilidade social e influenciar a opinião pública
para que o governo adote medidas punitivas e coercitivas contra
os movimentos dos trabalhadores e para impedir que a reforma
agrária se concretize".
Segundo a professora Monica Martins, da Rede Social, as forças
conservadoras que se opõem à reforma também
resistem a qualquer mudança no sentido de garantir
distribuição de renda no País. Ela afirma
ainda que "a reforma agrária constitui a forma
mais viável e democrática de assegurar o trabalho
e alimento aos brasileiros. A um só tempo, ela é
o caminho duradouro, rápido e barato para aumentar
a produção, gerar emprego a custos inferiores
ao da indústria, distribuir renda, conter a migração
paras as cidades e eliminar a pobreza dos grandes contingentes
populacionais, além de contribuir para transformar
as relações políticas no meio rural,
propiciando aos trabalhadores do campo os direitos de cidadão".
A Constituição brasileira determina em seu artigo
184: "Compete à União desapropriar por
interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel
rural que não esteja cumprindo sua função
social, mediante prévia e justa indenização
em títulos da dívida agrária, com cláusula
de preservação do valor real, resgatáveis
no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano
de sua emissão, e cuja utilização será
definida em lei".
Dessa forma, a desapropriação de terras que
não cumpre sua função social não
possui sequer um caráter punitivo, uma vez que existem
mecanismo de compensação econômica mesmo
para quem se apropria de bem público - a terra - apenas
para especulação. O que determina a função
social da terra é o nível de produtividade,
além de critérios que incluem proteção
ao meio ambiente e direitos trabalhistas.
Concentração Fundiária e Latifúndio
Ocioso
Estatísticas revelam que a concentração
de terra no Brasil é uma das maiores do mundo. Não
chega a 50 mil o número de proprietários rurais
que possuem áreas superiores a mil hectares. Aproximadamente
1% detém em torno de 46% de todas as terras. Apenas
60 milhões de hectares são utilizados como lavoura,
dos 400 milhões titulados como propriedade privada.
O restante das terras destina-se à pecuária,
está sub-utilizado e, o que é mais grave, ocioso.
Dados do Incra mostram que cerca de 100 milhões de
hectares de terras estão ociosos no Brasil.
Segundo Frei Betto, assessor especial da Presidência
da República, o país possui 600 milhões
de hectares cultiváveis, dos quais 250 milhões
são áreas devolutas e 285 milhões, latifúndios,
em sua maior parte improdutivos. Ainda de acordo com ele,
138 milhões de hectares estão em mãos
de apenas 28 mil proprietários, e 85 milhões
de hectares em poder de apenas 4.236 proprietários.
Por outro lado, existem cerca de 4,8 milhões de famílias
de trabalhadores rurais "sem terra", ou seja, que
vivem em condições de posseiros, arrendatários,
meeiros ou com propriedades de menos de 5 hectares. As melhores
terras destinam-se à monocultura de cultivos para exportação
de produtos como laranja, cana, soja, algodão e café.
Ao mesmo tempo, 40 milhões de pessoas passam fome no
país, estando a grande maioria concentrada no campo.
Os chamados "pequenos produtores" são responsáveis
pela maior parte da produção e, também,
pela geração de empregos na área rural.
Assim sendo, a reforma agrária é fundamental
para resolução dos problemas sócio-econômicos
no Brasil. Ao mesmo tempo em que a concentração
de terras se perpetua, cresce a violência contra trabalhadores
rurais e impera a impunidade dos crimes do latifúndio.
Violência e Impunidade
A Comissão Pastoral da Terra registrou 61 assassinatos
de trabalhadores rurais, no período de janeiro a outubro
de 2003. Entre 1985 e 2002, foram registrados 1.280 assassinatos
de trabalhadores rurais, advogados, técnicos, lideranças
religiosas e sindicais ligados à luta pela terra. Desse
total, somente 121 foram levados a julgamento. Entre os mandantes
dos crimes, apenas 14 foram julgados, sendo sete condenados.
Foram levados a julgamento quatro intermediários, sendo
dois condenados. Entre os 96 executores julgados, 58 foram
condenados.
Naquele mesmo período, 6.330 trabalhadores rurais foram
presos em função de suas atividades políticas
vinculadas à luta pela reforma agrária. Em 2001,
ocorreram 29 assassinatos, 254 prisões arbitrárias
de trabalhadores rurais e, no ano seguinte, 158 camponeses
foram presos. Em 2002, houve 43 assassinatos, 20 sofreram
tentativas e 73 ameaças de morte, além de 44
agredidos fisicamente e 20 torturados. Esses números
denotam que, historicamente, a violência no campo é
praticada contra os trabalhadores sem terra.
Por intermédio da Medida Provisória nº
2.027, de 04 de maio de 2000, o governo Fernando Henrique
Cardoso criou maiores dificuldades para a realização
da reforma agrária. A MP estabelece que "o imóvel
rural objeto de esbulho possessório ou invasão
motivada por conflito agrário ou fundiário não
será vistoriado nos dois anos seguintes à desocupação
do imóvel. Em caso de reocupação do referido
imóvel, este prazo será duplicado.
Tal medida é inconstitucional uma vez que a Constituição
não prevê a hipótese de imunidade à
desapropriação de imóvel rural. Ela serve,
ainda, como instrumento de repressão contra ocupações
de latifúndios improdutivos por movimentos sociais.
O Relator Especial da ONU, Jean Ziegler, que esteve no Brasil
de 1 a 18 de março de 2002, elaborou pesquisa revelando
que é possível acabar com a fome através
da reforma agrária e do apoio aos pequenos produtores.
A prioridade seria o acesso à alimentação
no mercado interno. Para atingir tal objetivo, o relator recomenda
maior rapidez nas desapropriações, combate à
grilagem, implementação do projeto de lei que
limita o tamanho das propriedades rurais e a revogação
da medida provisória que proíbe a desapropriação
de terras ocupadas por trabalhadores sem terra.
Exemplificaremos a seguir casos graves de violência
contra trabalhadores rurais em áreas onde a repressão
costuma ser mais severa, como no Pará, Paraná,
Paraíba, Pernambuco e São Paulo.
Pará
Nas últimas décadas, centenas de camponeses
foram vítimas de violentos conflitos pela posse da
terra. Levantamento realizado pela Comissão Pastoral
da Terra (CPT) mostra que, até outubro de 2003, foram
registrados 35 assassinatos de trabalhadores rurais no Estado.
Somente no primeiro semestre de 2003, 20 trabalhadores rurais
foram presos durante ações de despejo. Entre
1971 e 2002, foram assassinados 726 camponeses, sendo que
a maioria dessas mortes - 547 - foi registrada nas regiões
sul e sudeste do Pará.
Atualmente, há no Estado cerca de 20 mil famílias
sem terra em acampamentos e ocupações. Sem solução
do governo, alguns conflitos se arrastam há mais de
cinco anos. Os municípios de São Félix
do Xingu, Tucuruí, Rondon do Pará e Marabá
abrigam diversos acampamentos.
Vale ressaltar que um novo tipo de conflito se agrava no Estado.
Na região do Sudeste e Baixo Amazonas há uma
disputa pela posse da terra para o plantio de soja pelos chamados
"Gaúchos". Dezenas de grileiros, vindos principalmente
do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, numa acirrada disputa
pela terra, acabam por expulsar os colonos na base da violência.
Em Altamira, Porto de Moz, Itaituba, Almerim, Monte Alegre
e Prainha grileiros expulsaram populações tradicionais
e ocuparam a terra nas margens de rios e rodovias.
Paraná
O Paraná pode ser considerado um dos estados brasileiros
com maior incidência de violações contra
trabalhadores rurais. A situação se agravou
principalmente durante o governo Jaime Lerner, quando foi
estabelecida uma política repressiva contra os trabalhadores.
A Secretaria de Segurança iniciou uma série
de despejos em acampamentos de famílias sem terra.
Na ocasião, grupos de elite da Polícia Militar,
como o setor Anti-Seqüestro, o Grupo Águia e os
Grupos de Operações Especiais (GOE e COPE) foram
acionados pelo governo estadual para cercarem as regiões
onde havia ocupações.
Representantes do CPT-PR afirmam que o governo Jaime Lerner
foi responsável por uma onda de violência que
resultou no assassinato de 16 trabalhadores. Além disso,
31 pessoas foram vítimas de atentados, 47 ameaçadas
de morte e 7 vítimas de tortura. O número de
feridos chegou a 324 e o de presos a 488, em 134 ações
de despejo.
Já o governo de Roberto Requião tem tratado
de forma democrática a luta pela terra, o que tem levado
os fazendeiros a agirem por conta própria. Ruralistas
intimidam trabalhadores organizando milícias armadas.
Até mesmo uma lista com nomes de sem terra ameaçados
de morte foi encontrada recentemente. A listagem teria sido
elaborada no mês de abril, em Campo Mourão, durante
reunião de fazendeiros. Eles têm pressionado
o governo para que realize despejos de famílias sem
terra, contrariando política governamental de tratar
a questão agrária sem uso de força.
Um dos nomes incluídos na lista é o do trabalhador
rural Francisco Nascimento de Souza, de 27 anos, assassinado
em 4 de agosto de 2003, em Mariluz, Noroeste do Estado. Ele
foi atingido por oito tiros nas costas quando ia de moto da
cidade para o assentamento Nossa Senhora Aparecida, onde morava.
Em 18 de junho de 2003, fazendeiros de Ponta Grossa lançaram
o "Movimento Reforma Agrária Sem Invasões".
Segundo o documento, a preocupação maior dos
fazendeiros "recai no sentido de que tais acampamentos
se constituam em ponto de apoio, para concentração
de integrantes do MST, para desencadearem uma onda de invasões
em outras áreas rurais. Também nossa preocupação
aumenta quando é notório que o Governo do Estado
não tem tomado as medidas necessárias no sentido
de fazer cumprir as ordens judiciais de reintegração
de posse, o que torna a ocupação prolongada,
fazendo com que se acumulem prejuízos e transtornos
aos proprietários das áreas invadidas".
Pernambuco
Desde o período colonial, a concentração
fundiária em Pernambuco tem sido marcada pela permanência
da monocultura da cana de açúcar, sob o comando
de grandes latifundiários. Após da falência
do setor, trabalhadores rurais passaram a reivindicar a posse
e utilização das terras ociosas.
A assessora da Comissão Pastoral da Terra, Marluce
Cavalcante de Melo, afirma que os desempregados foram expulsos
do campo, passando a residir na periferia das cidades, excluídos
socialmente e sendo utilizados pelas empresas e empreiteiros
como mão-de-obra barata, como um estoque de bóias-frias
e para o trabalho clandestino. Segundo ela, apenas em Pernambuco,
nos últimos 15 anos, mais de 150 mil postos de trabalho
foram extintos com a crise no setor de açúcar
e álcool. A região possui mais de 40 mil famílias
acampadas em terras improdutivas.
Em Pernambuco, de 1995 até 2001, ocorreram 14 assassinatos
de trabalhadores rurais, 43 casos de tortura, 232 prisões
arbitrárias e 416 casos de agressão física
e ferimentos em 842 conflitos de terra. De 2002 a outubro
de 2003, foram 9 assassinatos.
Repressão e Despejo
Uma das mais sérias áreas de conflito se localiza
na Usina Aliança. A empresa demitiu mais de mil trabalhadores,
sem pagar qualquer direito trabalhista. Fechada desde 1996
e com grandes dívidas com o Banco do Brasil, a Usina
possuía, em 1998, um passivo superior a 250 milhões
de reais. Lesados nos acordos trabalhistas, os demitidos permanecem
na área desde 1996, reivindicando reforma agrária.
A desapropriação das terras improdutivas da
Usina Aliança depende de uma decisão do Juiz
da 7ª Vara Federal.
Em 2003, entidades ligadas aos direitos humanos participaram
da defesa de trabalhadores rurais ameaçados de despejo
no Engenho Prado, região de Nazaré da Mata.
Os advogados da CPT argumentam que as benfeitorias e lavouras
cultivadas pelos trabalhadores foram avaliadas em 5 milhões
de reais, o que demonstra a viabilidade econômica daquela
comunidade. O Engenho Prado foi desativado há 30 anos.
Com a demanda de sua desapropriação, o Grupo
João Santos alegou que iria realizar um projeto de
reflorestamento na área.
Os advogados pretendem reter o imóvel até que
as famílias sem terra sejam indenizadas e que os devidos
procedimentos legais sejam cumpridos. A defesa dos trabalhadores
foi negada pelo Juiz de Nazaré da Mata, Carlos Alberto
Maranhão. Ele impediu o acesso dos advogados ao processo,
ao conceder vistas aos advogados do Grupo João Santos
enquanto o despejo era cumprido, no dia 3 de junho de 2003.
Todas as petições e requerimentos apresentados
pelos trabalhadores foram ignorados pelo Juiz, que determinou
o despejo, além da demolição de residências,
igrejas e lavouras construídas por 300 famílias
que viveram na área durante seis anos.
Além desses casos, a Direção Estadual
do MST acrescenta que os trabalhadores acampados há
cinco anos no Engenho Ajudante, pertencente à Usina
Aliança, sofrem constantes ameaças e humilhações
por parte dos pistoleiros, que já destruíram
várias vezes as lavouras dos trabalhadores, envenenaram
a água que o acampamento consumia e, por várias
vezes, atiraram contra as famílias. Em abril deste
ano, um trabalhador foi ferido a bala pelos pistoleiros.
Em agosto de 2003, uma movimentação estranha
de carros e motos foi percebida nos acampamentos e assentamentos
na região da Mata Norte. Testemunhas afirmam que eram
pistoleiros procurando por líderes do MST: Luíza,
Ivanildo, José Severino e Sebastião. No Assentamento
Morojosinho, onde mora Luíza, os pistoleiros chegaram
em sua casa portando armas e reafirmaram as ameaças.
As quatro lideranças procuradas por pistoleiros deixaram
a região imediatamente, mas o medo permanece. Seus
parentes e familiares continuam sendo ameaçados.
Em
1998, durante greve de canavieiros na Usina Santa Teresa,
pertencente ao Grupo João Santos, o trabalhador rural
Luiz Carlos foi baleado na nuca, e outros 13 agricultores
foram feridos pelas costas. Policiais Militares e pistoleiros
reprimiram com tiros a manifestação grevista.
A ação penal instaurada ainda está na
fase de pronúncia dos criminosos acusados.
Em 2002, seguranças da Usina Petribú seqüestraram
e torturaram dois adolescentes que, com fome, comiam frutas
que estavam nas terras da usina. Depois de denúncias
de várias entidades, a Fundação Abrinq
suspendeu o selo de empresa Amiga da Criança. Embora
as entidades tenham entrado com uma ação penal,
até agora os responsáveis não foram punidos.
Paraíba
De 1995 até 2001, na Paraíba, foram registrados
4 assassinatos, 14 casos de tortura e 333 casos de trabalhadores
rurais agredidos fisicamente ou feridos em 218 conflitos no
campo. Ocorreram, ainda, 187 prisões e processos contra
agentes pastorais e trabalhadores rurais. De 2002 a outubro
de 2003, ocorreu um assassinato.
Na amanhã de 4 de junho de 2003, cerca de 1.500 trabalhadores
sem terra que trabalhavam em sistema de mutirão na
Fazenda São José, município de Jacaraú,
a 65 quilômetros de João Pessoa, foram surpreendidos
por um grupo fortemente armado comandado pelo proprietário
da fazenda, Marcos Napoleão. O trabalhador Antônio
Alves da Silva, 43 anos, foi morto e dez sem terra ficaram
feridos, três deles gravemente.
Em 5 de agosto de 2001, 50 famílias haviam ocupado
a propriedade. Baseado na Medida Provisória 2029, que
estabelece que "terra ocupada não será
vistoriada", o Incra negou a vistoria do imóvel,
solicitada pelos ocupantes. O Instituto de Terra da Paraíba
(INTERPA) se comprometeu a encaminhar propostas para resolver
o problema.. Nada foi resolvido.
O proprietário, Marcos Napoleão teve a casa
vistoriada pela Comissão Parlamentar de Inquérito
da Assembléia Legislativa que apurou denúncias
de formação de milícias privadas no estado
e violência no campo. Na ocasião, foram apreendidas
armas de fogo e munição. Napoleão é
conhecido na Paraíba como traficante de armas.
Frei Anastácio
No dia 6 de agosto de 2003, o Deputado Estadual e ex-coordenador
da CPT, Frei Anastácio, foi condenado, pelo Tribunal
de Justiça da Paraíba, a dois anos e dois meses
de reclusão e a multa de 10 salários mínimos,
sob acusação de formação de quadrilha
e dano qualificado. O CPT afirma que o julgamento teve caráter
político. O relator do processo citou o golpe militar
de 1964, alegando que "por menos os militares tomaram
o poder".
Despejo Violento e Prisões
Por volta da 1 hora da madrugada do dia 9 de agosto de 2003,
o acampamento da fazenda Santa Luzia, no município
de Cruz do Espírito Santo, foi invadido por sete pessoas,
entre eles o Sargento da PM Jaime Pessoa da Cunha. Armados
de rifles e espingardas, os soldados despejaram as famílias
e tomaram três trabalhadores como reféns, soltando-os
ao amanhecer, a cerca de 15 quilômetros do local. Barracas
e casas de taipa foram destruídas pela polícia.
Objetos e pertences incendiados. Os policiais destruíram
também cerca de 150 hectares de lavouras.
Desde junho de 2002, oito trabalhadores rurais que estavam
acampados na Fazenda Mendonça, no Município
de Itabaiana (PB) estão presos. O Incra vistoriou a
área e considerou-a como latifúndio improdutivo.
Fazendeiros, pistoleiros e policiais ameaçaram por
diversas vezes esses trabalhadores. O desaparecimento do trabalhador
rural Almir Muniz, em junho de 2002, agravou ainda mais a
situação.
Em 9 de agosto daquele ano, 84 detentos fugiram do Presídio
Silvio Porto, onde estão presos os oito trabalhadores.
Membros da CPT-PB estão preocupados com a integridade
física e segurança dos detentos. Apenas este
ano já ocorreram cinco rebeliões no local. As
celas não são trancadas durante a noite e os
detentos controlam os pavilhões. A situação
foi denunciada após a visita de Dom Pedro Casaldáliga
e Frei Anastácio ao presídio.
Alagoas
Ameaças
de Morte e Prisões
Em 22 de junho de 2003, a CPT denunciou ameaças de
morte em Alagoas. Nos dois primeiros meses do ano, a Comissão
havia denunciado que a Irmã Cícera Menezes estava
sendo ameaçada por fazendeiros. A acusação:
o apoio às famílias sem terra do Assentamento
Jubileu 2000, no município de São Miguel dos
Milagres. Por denunciar trabalho clandestino na cidade de
Colônia, a Irmã Lígia Dellacorte, agente
pastoral da CPT, recebeu duas ameaças por telefone.
Na região da Mata Norte, pistoleiros ligados ao prefeito
de União dos Palmares estariam planejando o assassinato
de dois agentes da CPT - Carlos Lima e José Severino,
além de membros do MST - José Carlos e José
Cícero e Cristiano. Segundo a CPT, uma testemunha denunciou
o encontro entre prefeito e pistoleiros.
No dia 5 de agosto de 2003, famílias sem terra acampadas
no litoral norte de Alagoas realizavam manifestação
na rodovia de Porto de Pedras. Elas reivindicavam alimentos
para os acampados, já que o Ministro do Desenvolvimento
Agrário, Miguel Rosseto, e o Superintendente do Incra/Alagoas,
Mário Agra, em visita a um assentamento no agreste
alagoano, há um mês, tinham anunciado a distribuição
de cestas básicas para as 10 mil famílias acampadas
no estado.
O juiz, Rivoldo Sarmento, foi ao local, acompanhado pela polícia,
e prendeu, sem critério, oito trabalhadores. Um deles
de 71 anos e dois menores de idade. Segundo o juiz, as prisões
foram motivadas por pedágio promovido pelas famílias.
Entretanto, não havia ocorrência nas delegacias.
Em 1999, o mesmo juiz prendeu cinco lideranças sem
terra, não apresentando argumentos jurídicos
e consistentes.
Na tarde de 17 de agosto de 2003, o acampamento Lucena foi
invadido por seis homens encapuzados e portando armas de grosso
calibre. Rapidamente os capangas renderam sete moradores,
entre eles uma criança, que foram humilhados e espancados.
O grupo agrediu ainda uma pessoa que passava pelo local.
A Comissão Pastoral da Terra encaminhou denúncias
à superintendência do Incra, Governo do Estado,
Ouvidoria Agrária Nacional, Ministério Público
e Conselho Estadual de Direitos Humanos.
A fazenda Lucena, em Porto de Pedras, possui 393 hectares
e foi desapropriada em novembro de 2002. O acampamento foi
criado no mês seguinte e abriga 32 famílias.
Sergipe
Violência
no Acampamento
No dia 21 de junho de 2003, 87 famílias acamparam à
beira da rodovia que liga Monte Alegre a Pão de Açucar
(AL), próximo ao povoado Niterói, município
de Porto da Folha (SE), com o objetivo de reivindicar as fazendas
próximas, entre elas as fazendas de Niterói
e Saco Grande, de propriedade de Orlando Rocha Filho, com
cerca de 1.500 hectares.
Uma semana depois, um grupo de homens armados com revólveres,
metralhadoras e fuzis invadiu o acampamento ameaçando
homens, mulheres e crianças. Embora estivesse à
paisana, alguns policiais foram reconhecidos: Giovane, conhecido
como filho de Heloi de Monte Alegre; Jair, Cabo da PM que
presta serviços em Niterói; Agilton, que também
presta serviços em Niterói; outros dois reconhecidos
por serem policiais em Arapiraca (AL); além do administrador
da Fazenda Niterói, conhecido como Júnior -
popular Burrego.
Morte no Campo
O corpo do trabalhador sem terra Luiz Bispo dos Santos, de
42 anos, foi encontrado numa área de mangue, no dia
12 de julho de 2003. Desaparecido há quatro dias, Luiz
Bispo era um dos coordenadores do acampamento da fazenda Berta
Grande.
O MST acredita que o trabalhador tenha sido assassinado. Ele
vinha sofrendo ameaças do proprietário da fazenda,
conhecido como Dr. Luiz, e por seus dois filhos. No dia 7
de julho, o fazendeiro chegou a ameaçar a vítima
com um revólver.
São
Paulo
Os principais casos de violações de direitos
humanos contra trabalhadores rurais no Estado ocorrem na região
do Pontal do Paranapanema. Segundo o advogado Patrick Mariano
Gomes, "a partir de 2002, desencadeou-se na Comarca de
Teodoro Sampaio, a maior estratégia de criminalização
contra movimentos sociais no País. Um grupo de Promotores
da região, visando enquadrar juridicamente as ações
de reivindicações de reforma agrária
do MST, elaborou dezenas de denúncias criminais contra
lavradores integrantes do movimento".
Estas violações decorrem da reação
dos latifúndios contra a popularidade que o MST ganhou
na região, principalmente a partir de 1990. O advogado
Marcos Rogério de Souza revela que entre 1990 e 1999,
94 assentamentos rurais foram implantados e 6.066 famílias
assentadas, graças à organização
do MST.
Prisões arbitrárias
Prisões preventivas sem base legal são a principal
forma de repressão ao MST no Pontal do Paranapanema.
Geralmente, o argumento utilizado para estas decisões
é a suposta garantia da ordem pública em que
os trabalhadores são acusados de formação
de bando ou quadrilha por organizarem manifestações
e acampamentos reivindicando reforma agrária.
Embora há um ano não tenha ocorrido nenhuma
ocupação de terras na região, entre agosto
de 2002 e novembro de 2003, o juiz Átis de Araújo
Oliveira, da Comarca de Teodoro Sampaio, no Pontal do Paranapanema,
decretou 12 ordens de prisão envolvendo 46 membros
do movimento. Todas essas decisões foram anuladas em
tribunais superiores.
Tudo isso, porém, não tem limitado as ações
do juiz titular da Comarca de Teodoro Sampaio, que continua
perseguindo os trabalhadores. A repressão contra o
MST no Pontal do Paranapanema adquire formato estritamente
político, que tem como objetivo reprimir o questionamento
feito pelo movimento social à intensa degradação
ambiental produzida pelo latifúndio, abandono e improdutividade
de mais de 90% da área total do Pontal, grilagem de
terras e sua má distribuição.
Em habeas corpus onde se discutia a legalidade da prisão
de cinco integrantes do MST daquela região, o Ministro
do STJ, Luiz Vicente Cernichiario, em voto proferido no Acórdão
de nº 5.574/SP, registra que o MST "não se
trata de movimento para tomar a propriedade alheia. Mas de
movimento para pressionar - daí haver eu dito, expressão
do direito da cidadania - a reforma agrária".
Recentemente, o Ministro Paulo Medina, da Sexta Turma do STJ,
concedeu liberdade para Valmir Rodrigues Chaves e Mário
Barreto, integrantes do MST no Pontal, e deixou registrado
que estes: "são obreiros rurais integrantes do
MST, que lutam e sacrificam-se por mais razoável meio
de vida, onde a dignidade social somente pode ser restaurada
no momento em que se fizer a verdadeira, necessária
e indispensável reforma no País". Ainda
segundo o ministro, "enquanto campear a incerteza de
seus resultados e for incerta a atuação política,
encontrar-se-á a revolta justa e a insatisfação
crescente dos menos favorecidos nos contextos econômico,
social e político do Brasil".
Rio Grande do Sul
Documentos elaborados pelas Pastorais Sociais da CNBB, no
estado do Rio Grande do Sul, mostram que a maior concentração
de terras localiza-se na Região da Campanha, uma das
mais pobres do Estado. Essa concentração é
originária da ocupação pelos portugueses
e bandeirantes, nos idos de 1700, que desalojaram as comunidades
indígenas e se apossaram das terras e dos rebanhos
bovinos.
São Gabriel
Em 11 de agosto de 2003, Pastorais Sociais da região
divulgaram nota afirmando que "O município de
São Gabriel, com área de 539 mil hectares, é
exemplo de concentração de terras no Estado.
Existem 1,3 mil propriedades com área de até
cem hectares, que representam 72% dos produtores do município,
mas detêm apenas 20 mil hectares, menos de 4% do total
das terras. No outro extremo, estão os 122 proprietários
de áreas entre mil e 10 mil hectares, ocupando uma
área de 208 mil hectares, ou 38% do total das terras.
A fazenda Southall, de 13,2 mil hectares, desapropriada pelo
Governo Federal, é maior do que 133 municípios
gaúchos e, conforme vistoria do INCRA, é improdutiva,
além de possuir altas dívidas com bancos e com
o Estado". A dívida da Southall com o INSS, Banco
do Brasil e outros órgãos públicos é
estimada em 32 milhões de reais.
Ainda em agosto, o Supremo Tribunal Federal manteve a suspensão
do decreto de desapropriação do complexo Southall.
Acatando o argumento de que o proprietário não
havia sido notificado sobre a realização da
vistoria, a Ministra Ellen Gracie suspendeu a desapropriação.
O MST denuncia que, na verdade, o proprietário estava
no local e impediu a vistoria dos funcionários do INCRA.
A vistoria só foi realizada com medida de segurança
e proteção policial.
Panfletos Fascistas
Panfletos com conteúdo fascista contra os movimentos
sociais têm sido distribuídos por latifundiários
como forma de estimular a violência. Em julho de 2003,
uma marcha pacífica do MST foi bloqueada por fazendeiros
armados numa tentativa de intimidar os manifestantes que se
dirigiam a São Gabriel. O deputado Frei Sérgio
Gorgen pediu que o governo atuasse para garantir o direito
de circulação e manifestação dos
trabalhadores. Todavia, o direito de ir e vir do MST foi negado
pela Justiça.
Em junho de 2003, fazendeiros de São Gabriel distribuíram
o seguinte panfleto à população:
"Povo
de São Gabriel, não permita que sua cidade tão
bem conservada nesses anos seja agora maculada pelos pés
deformados e sujos da escória humana. (...) Nós
não merecemos que essa massa podre, manipulada por
meia dúzia de covardes que se escondem atrás
de estrelinhas no peito, venham trazer o roubo, a violência,
o estupro, a morte. Estes ratos precisam ser exterminados.
(...) É preciso correr sangue para mostrarmos nossa
bravura. Se tu, gabrielense amigo, possuis um avião
agrícola, pulveriza à noite 100 litros de gasolina
em vôo rasante sobre o acampamento de lona dos ratos.
Sempre haverá uma vela acesa para terminar o serviço
e liquidar com todos eles. (...) Se tu, gabrielense amigo,
possuis uma arma de caça calibre 22, atira de dentro
do carro contra o acampamento, o mais longe possível.
A bala atinge o alvo mesmo a 1.200 metros de distância".
O setor jurídico do MST pediu que o Ministério
Público e a Assembléia Legislativa do Rio Grande
do Sul apurem a autoria do panfleto e punam os responsáveis.
Tocantins
Despejo
em Assentamento do Incra
Fr. Xavier Plassat, membro da CPT Araguaia-Tocantins, denuncia
a violência contra trabalhadores locais, como no caso
do assentamento PA Remansão, criado em setembro de
2001 no município de Nova Olinda (TO). Até então
grilada por fazendeiros, esta área da União
havia sido ocupada por famílias da região. Juntamente
com as 104 famílias regularizadas desde 2002, outras
43 foram ali assentadas, posteriormente, pelo Incra, em uma
parte da área cujo domínio pela União
passou a ser contestado pelo fazendeiro Wagner Luis Gratão,
por intermédio de seu procurador, Luis Carneiro.
Por se tratar de uma área sob jurisdição
federal e, portanto, sem competência para fazê-lo,
o Juiz de Araguaína, cidade próxima ao assentamento,
a pedido do fazendeiro, concedeu liminar de despejo. A ação
foi executada com requintes de violência por vinte oficiais
da PM, acompanhados por dois oficiais de justiça, além
de dois pistoleiros. O grupo entrou no assentamento, derrubou
e queimou casas e ainda incendiou a terra, recém preparada
para o plantio.
Acatando, finalmente, requerimento da Procuradoria do Incra,
em janeiro de 2003, o juiz remeteu o processo para a Justiça
Federal. Mesmo assim, no dia 6 de abril, cinco pistoleiros
invadiram a área novamente aterrorizando as famílias
e obrigando-as a subir no mesmo caminhão que há
pouco transportara, para dentro do assentamento, cerca de
onze peões aliciados em Araguaína, a serviço
do fazendeiro, a fim de derrubar o cerrado. Após rápida
intervenção da Polícia Federal, seis
pessoas foram presas acusadas de aliciamento de trabalhadores
rurais, redução à condição
escrava, constrangimento e porte ilegal de armas.
Sob ameaças
Nos últimos meses cresceram as ameaças por parte
do ex-PM Arnaldo, chefe da pistolagem na área, às
famílias, aos sindicalistas e ao agente da CPT Edmundo
Rodrigues Costa, que acompanha o grupo dos assentados. Em
maio de 2003, enquanto operadores de moto-serra, contratados
por Luis Carneiro, tentavam derrubar o cerrado do assentamento,
quatro jovens trabalhadores rurais do PA Remansão (Faz.
Ilha II), foram presos ao incendiar as moto-serras, sendo
liberados dois dias depois.
No dia 13 de junho, quatro desconhecidos procuraram por Edmundo
na sede da CPT Araguaína-TO. Um dos familiares do fazendeiro
comentou que "não ia deixar Edmundo viver por
muito tempo".
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