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Relatórios


A Comissão Pastoral da Terra registrou 61 assassinatos de trabalhadores rurais, no período de janeiro a outubro de 2003. Entre 1985 e 2002, foram registrados 1.280 assassinatos de trabalhadores rurais, advogados, técnicos, lideranças religiosas e sindicais ligados à luta pela terra. Desse total, somente 121 foram levados a julgamento. Entre os mandantes dos crimes, apenas 14 foram julgados, sendo sete condenados. Foram levados a julgamento quatro intermediários, sendo dois condenados. Entre os 96 executores julgados, 58 foram condenados.


Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, Comissão Pastoral da Terra, Centro de Direitos Humanos Evandro Lins e Silva e Instituto Carioca de Criminologia


Crimes do Latifúndio

A história de violência no campo no Brasil é causada pela enorme concentração fundiária. Embora a reforma agrária seja reconhecida como uma medida justa e necessária por especialistas e pelo povo brasileiro, existe, atualmente, uma campanha por parte de conservadores que tentam impedir sua implementação. Nota divulgada recentemente pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) denuncia que "as elites latifundiárias de nosso país (...) buscam de toda forma criar um clima de instabilidade social e influenciar a opinião pública para que o governo adote medidas punitivas e coercitivas contra os movimentos dos trabalhadores e para impedir que a reforma agrária se concretize".
Segundo a professora Monica Martins, da Rede Social, as forças conservadoras que se opõem à reforma também resistem a qualquer mudança no sentido de garantir distribuição de renda no País. Ela afirma ainda que "a reforma agrária constitui a forma mais viável e democrática de assegurar o trabalho e alimento aos brasileiros. A um só tempo, ela é o caminho duradouro, rápido e barato para aumentar a produção, gerar emprego a custos inferiores ao da indústria, distribuir renda, conter a migração paras as cidades e eliminar a pobreza dos grandes contingentes populacionais, além de contribuir para transformar as relações políticas no meio rural, propiciando aos trabalhadores do campo os direitos de cidadão".
A Constituição brasileira determina em seu artigo 184: "Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei".
Dessa forma, a desapropriação de terras que não cumpre sua função social não possui sequer um caráter punitivo, uma vez que existem mecanismo de compensação econômica mesmo para quem se apropria de bem público - a terra - apenas para especulação. O que determina a função social da terra é o nível de produtividade, além de critérios que incluem proteção ao meio ambiente e direitos trabalhistas.


Concentração Fundiária e Latifúndio Ocioso

Estatísticas revelam que a concentração de terra no Brasil é uma das maiores do mundo. Não chega a 50 mil o número de proprietários rurais que possuem áreas superiores a mil hectares. Aproximadamente 1% detém em torno de 46% de todas as terras. Apenas 60 milhões de hectares são utilizados como lavoura, dos 400 milhões titulados como propriedade privada. O restante das terras destina-se à pecuária, está sub-utilizado e, o que é mais grave, ocioso. Dados do Incra mostram que cerca de 100 milhões de hectares de terras estão ociosos no Brasil.
Segundo Frei Betto, assessor especial da Presidência da República, o país possui 600 milhões de hectares cultiváveis, dos quais 250 milhões são áreas devolutas e 285 milhões, latifúndios, em sua maior parte improdutivos. Ainda de acordo com ele, 138 milhões de hectares estão em mãos de apenas 28 mil proprietários, e 85 milhões de hectares em poder de apenas 4.236 proprietários.
Por outro lado, existem cerca de 4,8 milhões de famílias de trabalhadores rurais "sem terra", ou seja, que vivem em condições de posseiros, arrendatários, meeiros ou com propriedades de menos de 5 hectares. As melhores terras destinam-se à monocultura de cultivos para exportação de produtos como laranja, cana, soja, algodão e café. Ao mesmo tempo, 40 milhões de pessoas passam fome no país, estando a grande maioria concentrada no campo.
Os chamados "pequenos produtores" são responsáveis pela maior parte da produção e, também, pela geração de empregos na área rural. Assim sendo, a reforma agrária é fundamental para resolução dos problemas sócio-econômicos no Brasil. Ao mesmo tempo em que a concentração de terras se perpetua, cresce a violência contra trabalhadores rurais e impera a impunidade dos crimes do latifúndio.


Violência e Impunidade

A Comissão Pastoral da Terra registrou 61 assassinatos de trabalhadores rurais, no período de janeiro a outubro de 2003. Entre 1985 e 2002, foram registrados 1.280 assassinatos de trabalhadores rurais, advogados, técnicos, lideranças religiosas e sindicais ligados à luta pela terra. Desse total, somente 121 foram levados a julgamento. Entre os mandantes dos crimes, apenas 14 foram julgados, sendo sete condenados. Foram levados a julgamento quatro intermediários, sendo dois condenados. Entre os 96 executores julgados, 58 foram condenados.
Naquele mesmo período, 6.330 trabalhadores rurais foram presos em função de suas atividades políticas vinculadas à luta pela reforma agrária. Em 2001, ocorreram 29 assassinatos, 254 prisões arbitrárias de trabalhadores rurais e, no ano seguinte, 158 camponeses foram presos. Em 2002, houve 43 assassinatos, 20 sofreram tentativas e 73 ameaças de morte, além de 44 agredidos fisicamente e 20 torturados. Esses números denotam que, historicamente, a violência no campo é praticada contra os trabalhadores sem terra.
Por intermédio da Medida Provisória nº 2.027, de 04 de maio de 2000, o governo Fernando Henrique Cardoso criou maiores dificuldades para a realização da reforma agrária. A MP estabelece que "o imóvel rural objeto de esbulho possessório ou invasão motivada por conflito agrário ou fundiário não será vistoriado nos dois anos seguintes à desocupação do imóvel. Em caso de reocupação do referido imóvel, este prazo será duplicado.
Tal medida é inconstitucional uma vez que a Constituição não prevê a hipótese de imunidade à desapropriação de imóvel rural. Ela serve, ainda, como instrumento de repressão contra ocupações de latifúndios improdutivos por movimentos sociais.
O Relator Especial da ONU, Jean Ziegler, que esteve no Brasil de 1 a 18 de março de 2002, elaborou pesquisa revelando que é possível acabar com a fome através da reforma agrária e do apoio aos pequenos produtores. A prioridade seria o acesso à alimentação no mercado interno. Para atingir tal objetivo, o relator recomenda maior rapidez nas desapropriações, combate à grilagem, implementação do projeto de lei que limita o tamanho das propriedades rurais e a revogação da medida provisória que proíbe a desapropriação de terras ocupadas por trabalhadores sem terra.
Exemplificaremos a seguir casos graves de violência contra trabalhadores rurais em áreas onde a repressão costuma ser mais severa, como no Pará, Paraná, Paraíba, Pernambuco e São Paulo.


Pará

Nas últimas décadas, centenas de camponeses foram vítimas de violentos conflitos pela posse da terra. Levantamento realizado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) mostra que, até outubro de 2003, foram registrados 35 assassinatos de trabalhadores rurais no Estado. Somente no primeiro semestre de 2003, 20 trabalhadores rurais foram presos durante ações de despejo. Entre 1971 e 2002, foram assassinados 726 camponeses, sendo que a maioria dessas mortes - 547 - foi registrada nas regiões sul e sudeste do Pará.
Atualmente, há no Estado cerca de 20 mil famílias sem terra em acampamentos e ocupações. Sem solução do governo, alguns conflitos se arrastam há mais de cinco anos. Os municípios de São Félix do Xingu, Tucuruí, Rondon do Pará e Marabá abrigam diversos acampamentos.
Vale ressaltar que um novo tipo de conflito se agrava no Estado. Na região do Sudeste e Baixo Amazonas há uma disputa pela posse da terra para o plantio de soja pelos chamados "Gaúchos". Dezenas de grileiros, vindos principalmente do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, numa acirrada disputa pela terra, acabam por expulsar os colonos na base da violência. Em Altamira, Porto de Moz, Itaituba, Almerim, Monte Alegre e Prainha grileiros expulsaram populações tradicionais e ocuparam a terra nas margens de rios e rodovias.

Paraná

O Paraná pode ser considerado um dos estados brasileiros com maior incidência de violações contra trabalhadores rurais. A situação se agravou principalmente durante o governo Jaime Lerner, quando foi estabelecida uma política repressiva contra os trabalhadores. A Secretaria de Segurança iniciou uma série de despejos em acampamentos de famílias sem terra. Na ocasião, grupos de elite da Polícia Militar, como o setor Anti-Seqüestro, o Grupo Águia e os Grupos de Operações Especiais (GOE e COPE) foram acionados pelo governo estadual para cercarem as regiões onde havia ocupações.
Representantes do CPT-PR afirmam que o governo Jaime Lerner foi responsável por uma onda de violência que resultou no assassinato de 16 trabalhadores. Além disso, 31 pessoas foram vítimas de atentados, 47 ameaçadas de morte e 7 vítimas de tortura. O número de feridos chegou a 324 e o de presos a 488, em 134 ações de despejo.
Já o governo de Roberto Requião tem tratado de forma democrática a luta pela terra, o que tem levado os fazendeiros a agirem por conta própria. Ruralistas intimidam trabalhadores organizando milícias armadas. Até mesmo uma lista com nomes de sem terra ameaçados de morte foi encontrada recentemente. A listagem teria sido elaborada no mês de abril, em Campo Mourão, durante reunião de fazendeiros. Eles têm pressionado o governo para que realize despejos de famílias sem terra, contrariando política governamental de tratar a questão agrária sem uso de força.
Um dos nomes incluídos na lista é o do trabalhador rural Francisco Nascimento de Souza, de 27 anos, assassinado em 4 de agosto de 2003, em Mariluz, Noroeste do Estado. Ele foi atingido por oito tiros nas costas quando ia de moto da cidade para o assentamento Nossa Senhora Aparecida, onde morava.
Em 18 de junho de 2003, fazendeiros de Ponta Grossa lançaram o "Movimento Reforma Agrária Sem Invasões". Segundo o documento, a preocupação maior dos fazendeiros "recai no sentido de que tais acampamentos se constituam em ponto de apoio, para concentração de integrantes do MST, para desencadearem uma onda de invasões em outras áreas rurais. Também nossa preocupação aumenta quando é notório que o Governo do Estado não tem tomado as medidas necessárias no sentido de fazer cumprir as ordens judiciais de reintegração de posse, o que torna a ocupação prolongada, fazendo com que se acumulem prejuízos e transtornos aos proprietários das áreas invadidas".


Pernambuco

Desde o período colonial, a concentração fundiária em Pernambuco tem sido marcada pela permanência da monocultura da cana de açúcar, sob o comando de grandes latifundiários. Após da falência do setor, trabalhadores rurais passaram a reivindicar a posse e utilização das terras ociosas.
A assessora da Comissão Pastoral da Terra, Marluce Cavalcante de Melo, afirma que os desempregados foram expulsos do campo, passando a residir na periferia das cidades, excluídos socialmente e sendo utilizados pelas empresas e empreiteiros como mão-de-obra barata, como um estoque de bóias-frias e para o trabalho clandestino. Segundo ela, apenas em Pernambuco, nos últimos 15 anos, mais de 150 mil postos de trabalho foram extintos com a crise no setor de açúcar e álcool. A região possui mais de 40 mil famílias acampadas em terras improdutivas.
Em Pernambuco, de 1995 até 2001, ocorreram 14 assassinatos de trabalhadores rurais, 43 casos de tortura, 232 prisões arbitrárias e 416 casos de agressão física e ferimentos em 842 conflitos de terra. De 2002 a outubro de 2003, foram 9 assassinatos.


Repressão e Despejo

Uma das mais sérias áreas de conflito se localiza na Usina Aliança. A empresa demitiu mais de mil trabalhadores, sem pagar qualquer direito trabalhista. Fechada desde 1996 e com grandes dívidas com o Banco do Brasil, a Usina possuía, em 1998, um passivo superior a 250 milhões de reais. Lesados nos acordos trabalhistas, os demitidos permanecem na área desde 1996, reivindicando reforma agrária. A desapropriação das terras improdutivas da Usina Aliança depende de uma decisão do Juiz da 7ª Vara Federal.

Em 2003, entidades ligadas aos direitos humanos participaram da defesa de trabalhadores rurais ameaçados de despejo no Engenho Prado, região de Nazaré da Mata. Os advogados da CPT argumentam que as benfeitorias e lavouras cultivadas pelos trabalhadores foram avaliadas em 5 milhões de reais, o que demonstra a viabilidade econômica daquela comunidade. O Engenho Prado foi desativado há 30 anos. Com a demanda de sua desapropriação, o Grupo João Santos alegou que iria realizar um projeto de reflorestamento na área.
Os advogados pretendem reter o imóvel até que as famílias sem terra sejam indenizadas e que os devidos procedimentos legais sejam cumpridos. A defesa dos trabalhadores foi negada pelo Juiz de Nazaré da Mata, Carlos Alberto Maranhão. Ele impediu o acesso dos advogados ao processo, ao conceder vistas aos advogados do Grupo João Santos enquanto o despejo era cumprido, no dia 3 de junho de 2003. Todas as petições e requerimentos apresentados pelos trabalhadores foram ignorados pelo Juiz, que determinou o despejo, além da demolição de residências, igrejas e lavouras construídas por 300 famílias que viveram na área durante seis anos.
Além desses casos, a Direção Estadual do MST acrescenta que os trabalhadores acampados há cinco anos no Engenho Ajudante, pertencente à Usina Aliança, sofrem constantes ameaças e humilhações por parte dos pistoleiros, que já destruíram várias vezes as lavouras dos trabalhadores, envenenaram a água que o acampamento consumia e, por várias vezes, atiraram contra as famílias. Em abril deste ano, um trabalhador foi ferido a bala pelos pistoleiros.
Em agosto de 2003, uma movimentação estranha de carros e motos foi percebida nos acampamentos e assentamentos na região da Mata Norte. Testemunhas afirmam que eram pistoleiros procurando por líderes do MST: Luíza, Ivanildo, José Severino e Sebastião. No Assentamento Morojosinho, onde mora Luíza, os pistoleiros chegaram em sua casa portando armas e reafirmaram as ameaças. As quatro lideranças procuradas por pistoleiros deixaram a região imediatamente, mas o medo permanece. Seus parentes e familiares continuam sendo ameaçados.

Em 1998, durante greve de canavieiros na Usina Santa Teresa, pertencente ao Grupo João Santos, o trabalhador rural Luiz Carlos foi baleado na nuca, e outros 13 agricultores foram feridos pelas costas. Policiais Militares e pistoleiros reprimiram com tiros a manifestação grevista. A ação penal instaurada ainda está na fase de pronúncia dos criminosos acusados.
Em 2002, seguranças da Usina Petribú seqüestraram e torturaram dois adolescentes que, com fome, comiam frutas que estavam nas terras da usina. Depois de denúncias de várias entidades, a Fundação Abrinq suspendeu o selo de empresa Amiga da Criança. Embora as entidades tenham entrado com uma ação penal, até agora os responsáveis não foram punidos.


Paraíba

De 1995 até 2001, na Paraíba, foram registrados 4 assassinatos, 14 casos de tortura e 333 casos de trabalhadores rurais agredidos fisicamente ou feridos em 218 conflitos no campo. Ocorreram, ainda, 187 prisões e processos contra agentes pastorais e trabalhadores rurais. De 2002 a outubro de 2003, ocorreu um assassinato.
Na amanhã de 4 de junho de 2003, cerca de 1.500 trabalhadores sem terra que trabalhavam em sistema de mutirão na Fazenda São José, município de Jacaraú, a 65 quilômetros de João Pessoa, foram surpreendidos por um grupo fortemente armado comandado pelo proprietário da fazenda, Marcos Napoleão. O trabalhador Antônio Alves da Silva, 43 anos, foi morto e dez sem terra ficaram feridos, três deles gravemente.
Em 5 de agosto de 2001, 50 famílias haviam ocupado a propriedade. Baseado na Medida Provisória 2029, que estabelece que "terra ocupada não será vistoriada", o Incra negou a vistoria do imóvel, solicitada pelos ocupantes. O Instituto de Terra da Paraíba (INTERPA) se comprometeu a encaminhar propostas para resolver o problema.. Nada foi resolvido.
O proprietário, Marcos Napoleão teve a casa vistoriada pela Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembléia Legislativa que apurou denúncias de formação de milícias privadas no estado e violência no campo. Na ocasião, foram apreendidas armas de fogo e munição. Napoleão é conhecido na Paraíba como traficante de armas.

Frei Anastácio

No dia 6 de agosto de 2003, o Deputado Estadual e ex-coordenador da CPT, Frei Anastácio, foi condenado, pelo Tribunal de Justiça da Paraíba, a dois anos e dois meses de reclusão e a multa de 10 salários mínimos, sob acusação de formação de quadrilha e dano qualificado. O CPT afirma que o julgamento teve caráter político. O relator do processo citou o golpe militar de 1964, alegando que "por menos os militares tomaram o poder".


Despejo Violento e Prisões

Por volta da 1 hora da madrugada do dia 9 de agosto de 2003, o acampamento da fazenda Santa Luzia, no município de Cruz do Espírito Santo, foi invadido por sete pessoas, entre eles o Sargento da PM Jaime Pessoa da Cunha. Armados de rifles e espingardas, os soldados despejaram as famílias e tomaram três trabalhadores como reféns, soltando-os ao amanhecer, a cerca de 15 quilômetros do local. Barracas e casas de taipa foram destruídas pela polícia. Objetos e pertences incendiados. Os policiais destruíram também cerca de 150 hectares de lavouras.

Desde junho de 2002, oito trabalhadores rurais que estavam acampados na Fazenda Mendonça, no Município de Itabaiana (PB) estão presos. O Incra vistoriou a área e considerou-a como latifúndio improdutivo. Fazendeiros, pistoleiros e policiais ameaçaram por diversas vezes esses trabalhadores. O desaparecimento do trabalhador rural Almir Muniz, em junho de 2002, agravou ainda mais a situação.
Em 9 de agosto daquele ano, 84 detentos fugiram do Presídio Silvio Porto, onde estão presos os oito trabalhadores. Membros da CPT-PB estão preocupados com a integridade física e segurança dos detentos. Apenas este ano já ocorreram cinco rebeliões no local. As celas não são trancadas durante a noite e os detentos controlam os pavilhões. A situação foi denunciada após a visita de Dom Pedro Casaldáliga e Frei Anastácio ao presídio.


Alagoas

Ameaças de Morte e Prisões

Em 22 de junho de 2003, a CPT denunciou ameaças de morte em Alagoas. Nos dois primeiros meses do ano, a Comissão havia denunciado que a Irmã Cícera Menezes estava sendo ameaçada por fazendeiros. A acusação: o apoio às famílias sem terra do Assentamento Jubileu 2000, no município de São Miguel dos Milagres. Por denunciar trabalho clandestino na cidade de Colônia, a Irmã Lígia Dellacorte, agente pastoral da CPT, recebeu duas ameaças por telefone.
Na região da Mata Norte, pistoleiros ligados ao prefeito de União dos Palmares estariam planejando o assassinato de dois agentes da CPT - Carlos Lima e José Severino, além de membros do MST - José Carlos e José Cícero e Cristiano. Segundo a CPT, uma testemunha denunciou o encontro entre prefeito e pistoleiros.

No dia 5 de agosto de 2003, famílias sem terra acampadas no litoral norte de Alagoas realizavam manifestação na rodovia de Porto de Pedras. Elas reivindicavam alimentos para os acampados, já que o Ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rosseto, e o Superintendente do Incra/Alagoas, Mário Agra, em visita a um assentamento no agreste alagoano, há um mês, tinham anunciado a distribuição de cestas básicas para as 10 mil famílias acampadas no estado.
O juiz, Rivoldo Sarmento, foi ao local, acompanhado pela polícia, e prendeu, sem critério, oito trabalhadores. Um deles de 71 anos e dois menores de idade. Segundo o juiz, as prisões foram motivadas por pedágio promovido pelas famílias. Entretanto, não havia ocorrência nas delegacias. Em 1999, o mesmo juiz prendeu cinco lideranças sem terra, não apresentando argumentos jurídicos e consistentes.

Na tarde de 17 de agosto de 2003, o acampamento Lucena foi invadido por seis homens encapuzados e portando armas de grosso calibre. Rapidamente os capangas renderam sete moradores, entre eles uma criança, que foram humilhados e espancados. O grupo agrediu ainda uma pessoa que passava pelo local.
A Comissão Pastoral da Terra encaminhou denúncias à superintendência do Incra, Governo do Estado, Ouvidoria Agrária Nacional, Ministério Público e Conselho Estadual de Direitos Humanos.
A fazenda Lucena, em Porto de Pedras, possui 393 hectares e foi desapropriada em novembro de 2002. O acampamento foi criado no mês seguinte e abriga 32 famílias.


Sergipe

Violência no Acampamento

No dia 21 de junho de 2003, 87 famílias acamparam à beira da rodovia que liga Monte Alegre a Pão de Açucar (AL), próximo ao povoado Niterói, município de Porto da Folha (SE), com o objetivo de reivindicar as fazendas próximas, entre elas as fazendas de Niterói e Saco Grande, de propriedade de Orlando Rocha Filho, com cerca de 1.500 hectares.
Uma semana depois, um grupo de homens armados com revólveres, metralhadoras e fuzis invadiu o acampamento ameaçando homens, mulheres e crianças. Embora estivesse à paisana, alguns policiais foram reconhecidos: Giovane, conhecido como filho de Heloi de Monte Alegre; Jair, Cabo da PM que presta serviços em Niterói; Agilton, que também presta serviços em Niterói; outros dois reconhecidos por serem policiais em Arapiraca (AL); além do administrador da Fazenda Niterói, conhecido como Júnior - popular Burrego.


Morte no Campo

O corpo do trabalhador sem terra Luiz Bispo dos Santos, de 42 anos, foi encontrado numa área de mangue, no dia 12 de julho de 2003. Desaparecido há quatro dias, Luiz Bispo era um dos coordenadores do acampamento da fazenda Berta Grande.
O MST acredita que o trabalhador tenha sido assassinado. Ele vinha sofrendo ameaças do proprietário da fazenda, conhecido como Dr. Luiz, e por seus dois filhos. No dia 7 de julho, o fazendeiro chegou a ameaçar a vítima com um revólver.

São Paulo

Os principais casos de violações de direitos humanos contra trabalhadores rurais no Estado ocorrem na região do Pontal do Paranapanema. Segundo o advogado Patrick Mariano Gomes, "a partir de 2002, desencadeou-se na Comarca de Teodoro Sampaio, a maior estratégia de criminalização contra movimentos sociais no País. Um grupo de Promotores da região, visando enquadrar juridicamente as ações de reivindicações de reforma agrária do MST, elaborou dezenas de denúncias criminais contra lavradores integrantes do movimento".
Estas violações decorrem da reação dos latifúndios contra a popularidade que o MST ganhou na região, principalmente a partir de 1990. O advogado Marcos Rogério de Souza revela que entre 1990 e 1999, 94 assentamentos rurais foram implantados e 6.066 famílias assentadas, graças à organização do MST.


Prisões arbitrárias

Prisões preventivas sem base legal são a principal forma de repressão ao MST no Pontal do Paranapanema. Geralmente, o argumento utilizado para estas decisões é a suposta garantia da ordem pública em que os trabalhadores são acusados de formação de bando ou quadrilha por organizarem manifestações e acampamentos reivindicando reforma agrária.
Embora há um ano não tenha ocorrido nenhuma ocupação de terras na região, entre agosto de 2002 e novembro de 2003, o juiz Átis de Araújo Oliveira, da Comarca de Teodoro Sampaio, no Pontal do Paranapanema, decretou 12 ordens de prisão envolvendo 46 membros do movimento. Todas essas decisões foram anuladas em tribunais superiores.
Tudo isso, porém, não tem limitado as ações do juiz titular da Comarca de Teodoro Sampaio, que continua perseguindo os trabalhadores. A repressão contra o MST no Pontal do Paranapanema adquire formato estritamente político, que tem como objetivo reprimir o questionamento feito pelo movimento social à intensa degradação ambiental produzida pelo latifúndio, abandono e improdutividade de mais de 90% da área total do Pontal, grilagem de terras e sua má distribuição.
Em habeas corpus onde se discutia a legalidade da prisão de cinco integrantes do MST daquela região, o Ministro do STJ, Luiz Vicente Cernichiario, em voto proferido no Acórdão de nº 5.574/SP, registra que o MST "não se trata de movimento para tomar a propriedade alheia. Mas de movimento para pressionar - daí haver eu dito, expressão do direito da cidadania - a reforma agrária".
Recentemente, o Ministro Paulo Medina, da Sexta Turma do STJ, concedeu liberdade para Valmir Rodrigues Chaves e Mário Barreto, integrantes do MST no Pontal, e deixou registrado que estes: "são obreiros rurais integrantes do MST, que lutam e sacrificam-se por mais razoável meio de vida, onde a dignidade social somente pode ser restaurada no momento em que se fizer a verdadeira, necessária e indispensável reforma no País". Ainda segundo o ministro, "enquanto campear a incerteza de seus resultados e for incerta a atuação política, encontrar-se-á a revolta justa e a insatisfação crescente dos menos favorecidos nos contextos econômico, social e político do Brasil".


Rio Grande do Sul

Documentos elaborados pelas Pastorais Sociais da CNBB, no estado do Rio Grande do Sul, mostram que a maior concentração de terras localiza-se na Região da Campanha, uma das mais pobres do Estado. Essa concentração é originária da ocupação pelos portugueses e bandeirantes, nos idos de 1700, que desalojaram as comunidades indígenas e se apossaram das terras e dos rebanhos bovinos.


São Gabriel

Em 11 de agosto de 2003, Pastorais Sociais da região divulgaram nota afirmando que "O município de São Gabriel, com área de 539 mil hectares, é exemplo de concentração de terras no Estado. Existem 1,3 mil propriedades com área de até cem hectares, que representam 72% dos produtores do município, mas detêm apenas 20 mil hectares, menos de 4% do total das terras. No outro extremo, estão os 122 proprietários de áreas entre mil e 10 mil hectares, ocupando uma área de 208 mil hectares, ou 38% do total das terras. A fazenda Southall, de 13,2 mil hectares, desapropriada pelo Governo Federal, é maior do que 133 municípios gaúchos e, conforme vistoria do INCRA, é improdutiva, além de possuir altas dívidas com bancos e com o Estado". A dívida da Southall com o INSS, Banco do Brasil e outros órgãos públicos é estimada em 32 milhões de reais.
Ainda em agosto, o Supremo Tribunal Federal manteve a suspensão do decreto de desapropriação do complexo Southall. Acatando o argumento de que o proprietário não havia sido notificado sobre a realização da vistoria, a Ministra Ellen Gracie suspendeu a desapropriação. O MST denuncia que, na verdade, o proprietário estava no local e impediu a vistoria dos funcionários do INCRA. A vistoria só foi realizada com medida de segurança e proteção policial.


Panfletos Fascistas

Panfletos com conteúdo fascista contra os movimentos sociais têm sido distribuídos por latifundiários como forma de estimular a violência. Em julho de 2003, uma marcha pacífica do MST foi bloqueada por fazendeiros armados numa tentativa de intimidar os manifestantes que se dirigiam a São Gabriel. O deputado Frei Sérgio Gorgen pediu que o governo atuasse para garantir o direito de circulação e manifestação dos trabalhadores. Todavia, o direito de ir e vir do MST foi negado pela Justiça.
Em junho de 2003, fazendeiros de São Gabriel distribuíram o seguinte panfleto à população:

"Povo de São Gabriel, não permita que sua cidade tão bem conservada nesses anos seja agora maculada pelos pés deformados e sujos da escória humana. (...) Nós não merecemos que essa massa podre, manipulada por meia dúzia de covardes que se escondem atrás de estrelinhas no peito, venham trazer o roubo, a violência, o estupro, a morte. Estes ratos precisam ser exterminados. (...) É preciso correr sangue para mostrarmos nossa bravura. Se tu, gabrielense amigo, possuis um avião agrícola, pulveriza à noite 100 litros de gasolina em vôo rasante sobre o acampamento de lona dos ratos. Sempre haverá uma vela acesa para terminar o serviço e liquidar com todos eles. (...) Se tu, gabrielense amigo, possuis uma arma de caça calibre 22, atira de dentro do carro contra o acampamento, o mais longe possível. A bala atinge o alvo mesmo a 1.200 metros de distância".

O setor jurídico do MST pediu que o Ministério Público e a Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul apurem a autoria do panfleto e punam os responsáveis.

Tocantins

Despejo em Assentamento do Incra

Fr. Xavier Plassat, membro da CPT Araguaia-Tocantins, denuncia a violência contra trabalhadores locais, como no caso do assentamento PA Remansão, criado em setembro de 2001 no município de Nova Olinda (TO). Até então grilada por fazendeiros, esta área da União havia sido ocupada por famílias da região. Juntamente com as 104 famílias regularizadas desde 2002, outras 43 foram ali assentadas, posteriormente, pelo Incra, em uma parte da área cujo domínio pela União passou a ser contestado pelo fazendeiro Wagner Luis Gratão, por intermédio de seu procurador, Luis Carneiro.
Por se tratar de uma área sob jurisdição federal e, portanto, sem competência para fazê-lo, o Juiz de Araguaína, cidade próxima ao assentamento, a pedido do fazendeiro, concedeu liminar de despejo. A ação foi executada com requintes de violência por vinte oficiais da PM, acompanhados por dois oficiais de justiça, além de dois pistoleiros. O grupo entrou no assentamento, derrubou e queimou casas e ainda incendiou a terra, recém preparada para o plantio.
Acatando, finalmente, requerimento da Procuradoria do Incra, em janeiro de 2003, o juiz remeteu o processo para a Justiça Federal. Mesmo assim, no dia 6 de abril, cinco pistoleiros invadiram a área novamente aterrorizando as famílias e obrigando-as a subir no mesmo caminhão que há pouco transportara, para dentro do assentamento, cerca de onze peões aliciados em Araguaína, a serviço do fazendeiro, a fim de derrubar o cerrado. Após rápida intervenção da Polícia Federal, seis pessoas foram presas acusadas de aliciamento de trabalhadores rurais, redução à condição escrava, constrangimento e porte ilegal de armas.


Sob ameaças

Nos últimos meses cresceram as ameaças por parte do ex-PM Arnaldo, chefe da pistolagem na área, às famílias, aos sindicalistas e ao agente da CPT Edmundo Rodrigues Costa, que acompanha o grupo dos assentados. Em maio de 2003, enquanto operadores de moto-serra, contratados por Luis Carneiro, tentavam derrubar o cerrado do assentamento, quatro jovens trabalhadores rurais do PA Remansão (Faz. Ilha II), foram presos ao incendiar as moto-serras, sendo liberados dois dias depois.
No dia 13 de junho, quatro desconhecidos procuraram por Edmundo na sede da CPT Araguaína-TO. Um dos familiares do fazendeiro comentou que "não ia deixar Edmundo viver por muito tempo".