O
déficit habitacional do Brasil é de 6,6 milhões de
moradias. Destas, 5,3 milhões encontram-se em áreas urbanas
e 1,2 milhão em áreas rurais. Mais de 10 milhões de domicílios
são carentes de infra-estrutura e 84% do déficit
habitacional brasileiro é concentrado nas famílias com renda
de até três salários mínimos. A média de crescimento da
população brasileira
foi de 1,6 % ao ano e da população favelada de 4.3 %
ao ano, entre 1991 e 2000. O censo de 2000 registrou a existência
de 1,7 milhões de domicílios localizados em assentamentos
precários, totalizando 6,6 milhões de pessoas.
OBSTÁCULOS
E PRESSUPOSTOS PARA A GARANTIA DO DIREITO HUMANO À MORADIA NO
BRASIL – A Gravidade dos Despejos
Nelson Saule Jr.
e Patrícia de Menezes Cardoso
FUNDAMENTOS
DA RESPONSABILIDADE DO ESTADO BRASILEIRO SOBRE A PROTEÇÃO DO
DIREITO A MORADIA
O
Brasil evoluiu nos últimos 20 anos com a constituição de um
marco legal e institucional que possibilita a implantação de
políticas e sistemas de proteção do direito à moradia,
especialmente para os grupos sociais considerados vulneráveis
pelas condições social, econômica, cultural, de idade e gênero.
Dos fundamentos da responsabilidade do Estado Brasileiro de
promover a proteção do direito à moradia destacamos os
seguintes:
O
direito a moradia como direito humano fundamental: O
direito à moradia consolidado como direito fundamental, em
especial, por estar previsto expressamente como um direito
social no artigo 6° da Constituição Brasileira, tem como núcleo
básico o direito de viver com segurança, viver com paz e
viver com dignidade, podendo, somente com a observância
destes três elementos considerar-se plenamente satisfeito.
A
dignidade, segurança e paz dependem da garantia na ordem jurídica
brasileira do cumprimento dos componentes do direito à
moradia, para que ela seja, de fato, adequada. Os componentes
do direito à moradia são: a
Segurança Jurídica da Posse (todas as pessoas devem
possuir um grau de segurança de posse que lhes garanta a
proteção legal contra despejos forçados, expropriação,
deslocamentos, e outros tipos de ameaças); a Disponibilidade de Serviços e Infra-estrutura (acesso ao
fornecimento de água potável, fornecimento de energia, serviço
de saneamento e tratamento de resíduos, transporte, iluminação
pública); o Custo da Moradia Acessível (a proporcionalidade entre os gastos com
habitação e a renda das pessoas, criação de subsídios e
financiamentos para os grupos sociais de baixa renda, proteção
dos inquilinos contra aumentos abusivos de aluguel); a Habitabilidade
(a moradia deve ter condições físicas e de salubridade
adequadas); a Acessibilidade
(por grupos vulneráveis, como os grupos sociais empobrecidos,
mulheres, portadores de direitos especiais, vítimas de
desastres naturais ou de violência urbana); a Localização
(acesso às opções de emprego, transporte público
eficiente, serviços de saúde, escolas, cultura e lazer) e a Adequação
Cultural (respeito à diversidade cultural e aos padrões
habitacionais oriundos dos usos e costumes das comunidades e
grupos sociais).
Aplicação
das Normas Internacionais de Direitos Humanos: Aplicação
das normas internacionais de proteção do direito à moradia
previstas nos tratados e convenções do sistema internacional
de proteção dos direitos humanos (normas do direito
internacional dos direitos humanos), são normas subsidiárias
incorporadas no ordenamento jurídico brasileiro, em razão do
Brasil ser signatário destes tratados e convenções, em
especial das seguintes normas:
Pacto
Internacional dos Direitos Civis e Políticos (Artigo
17), Pacto Internacional dos Direitos Econômicos Sociais e
Culturais (Artigos 11 e 12), Convenção Internacional sobre a
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial
(Artigo V, item “e”), Convenção Internacional sobre a
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a
Mulher (Artigo 14. 2 (h) ), Convenção
sobre os Direitos da Criança (Artigo 21. item 1 e 3),Convenção
Americana de Direitos Humanos (Artigos 11 e 24), Carta da
Organização dos Estados Americanos (Artigo 34) e o Protocolo
Adicional à Convenção Americana de Direitos Humanos em Matéria
de Direitos Econômicos, Sociais
e Culturais (Artigo 11).
A
Responsabilidade dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário:
A responsabilidade preponderante das autoridades e dos agentes
do Poder Executivo, dos membros do Poder Legislativo e dos
membros do Poder Judiciário de atuarem em prol do
reconhecimento e da proteção do direito à moradia dos
grupos sociais vulneráveis que vivem nos assentamentos,
mediante a observância e aplicação dos princípios e
objetivos fundamentais do Estado Brasileiro, sobre tudo, dos
princípios da função social da cidade e da propriedade, que
são norteadores da política urbana e habitacional.
A
Responsabilidade dos Entes Federativos: As competências,
responsabilidades e funções constitucionais atribuídas a
União, Estados e Municípios para promover a política
habitacional e urbana, de modo a resultarem na obrigação do
reconhecimento e proteção do direito à moradia dos grupos
sociais necessitados que vivem nos assentamentos irregulares -
de modo que sejam desenvolvidos programas, planos e projetos
habitacionais destinados a melhorar as condições
habitacionais destes assentamentos e de legalizar, por meio de
um instrumento jurídico, a moradia destes grupos sociais.
BREVE
BALANÇO DA POLÍTICA URBANA E HABITACIONAL NACIONAL
O
Brasil tem dado passos para superar a falta de um sistema
nacional das cidades que tenha como um dos seus componentes um
sistema nacional de habitação, organizado de forma
descentralizada e democrática, com esferas públicas que
integrem os diversos setores do Poder Público (União,
Estados, Municípios) e segmentos da sociedade. Sem este
sistema a tendência, mesmo num Governo com compromissos com
as questões sociais, é de prevalecer na gestão das políticas
públicas as práticas políticas tradicionais - que destinam
os recursos dos programas e projetos para atender as
reivindicações dos grupos políticos da base aliada do
Governo (Prefeitos, Governadores e Deputados).
No
período de 2003/2004 a criação do Ministério das Cidades,
integrando a Secretaria Nacional de Habitação, de Saneamento
Ambiental, de Programas Urbanos e de Mobilidade Urbana, a
realização da primeira Conferência Nacional das Cidades em
9 outubro de 2003, viabilizando um ampla participação de
diversos segmentos da sociedade para definir os princípios e
as diretrizes destas políticas, e, a implantação do
Conselho Nacional das Cidades
em abril de 2004 com uma composição que espelha a
diversidade de segmentos da sociedade e que tem o papel de
acompanhar e avaliar a execução da política urbana
nacional, bem como a habitacional, são
passos significantes para a democratização da gestão
de um sistema nacional das cidades que possibilite uma integração
das políticas nacionais com os Estados e Municípios.
A
constituição deste sistema nacional das cidades é
fundamental para enfrentar o déficit habitacional de 6,6 milhões
de moradias. Destas, 5,3 milhões encontram-se em áreas
urbanas e 1,2 milhão em áreas rurais. Mais de 10 milhões de
domicílios são carentes de infra-estrutura e 84% do déficit
habitacional brasileiro é concentrado nas famílias com renda
de até três salários mínimos. A média de crescimento da
população brasileira foi
de 1,6 % ao ano e da população favelada de 4.3 % ao ano,
entre 1991 e 2000. O censo de 2000 registrou a existência de
1,7 milhões de domicílios localizados em assentamentos precários,
totalizando 6,6 milhões de pessoas.
O
Governo Federal tem vários programas de habitação de
interesse social destinados à população urbana e rural de
baixa renda para garantia do acesso à terra e à moradia,
tais como produção de moradia e urbanização de áreas
(Morar Melhor e Pró – Moradia, Arrendamento Residencial),
urbanização e regularização fundiária de assentamentos
informais (Habitar Brasil). No Programa de Subsídio à Habitação
de Interesse Social (PSH) é dada prioridade à mulher chefe
de família e às famílias de mais baixa renda, alcançando a
população urbana e rural. Este programa visa direcionar
recursos para a faixa de até cinco salários mínimos, onde
está concentrado 92% do déficit habitacional. Para o ano de
2004 estão previstos 325 milhões de reais direcionados para
atender 62 mil famílias de baixa renda
O Programa Crédito Solidário é destinado às famílias, organizadas em
cooperativas ou associações populares habitacionais, que
ganham de zero a três salários mínimos prioritariamente em
áreas metropolitanas, que conta com 542 milhões de reais
para 2004. De acordo com o Ministério das Cidades
aproximadamente três mil associações solicitaram o
credenciamento no programa para construir moradias populares.
Apesar destas medidas a lógica do sistema de financiamento
habitacional continua impondo obstáculos para programas que
atendem a população de menor renda.
Para
superar este obstáculo é necessária a aprovação no Congresso Nacional da proposta
de iniciativa popular que visa criar o sistema nacional de
habitação de interesse social (Projeto
de Lei n°
2.710/92) aprovada na Câmara dos Deputados e em tramitação
no Senado Federal. Este sistema tem como objetivos viabilizar
e promover o acesso à habitação, urbana e rural, para a
população de baixa renda, implementando, inclusive, uma política
de subsídios. Os recursos do Fundo seriam constituídos
principalmente por recursos do Orçamento Geral da União e
do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS. O
projeto de lei
aprovado na Câmara dos Deputados excluiu a obrigatoriedade da aplicação
dos recursos do FGTS no Fundo de Moradia Popular. Cabe ao
Senado Federal incluir esta obrigação para viabilizar os
recursos necessários para os
programas de moradia popular e sua aplicação de forma
adequada nos Estados e Municípios, considerando as
desigualdades regionais e sociais.
Outro
obstáculo que precisa ser superado é da fragmentação de
políticas e programas para
fins de moradia de diversos segmentos sociais. A
moradia dos trabalhadores rurais é tratada pelo Ministério
do Desenvolvimento Agrário – INCRA,
das populações indígenas
pelo Ministério da Justiça – FUNAI, das comunidades
quilombolas além
do INCRA também pela Fundação Palmares vinculada ao Ministério
da Cultura. Exerce uma função relevante para o
desenvolvimento da política habitacional nacional a
Secretaria Nacional de Patrimônio da União vinculada ao
Ministério do Planejamento. Com esta quantidade de órgãos
é fundamental que exista uma coordenação da política, que
deve ser feita pelo Ministério da Cidade, sendo a instância
principal de articulação o Conselho Nacional da Cidade.
Com
relação a maior investimento para o desenvolvimento urbano e
habitacional é relevante a proposta defendida pelo estado
Brasileiro nas comunidade e Fóruns Internacionais como o Fórum
Urbano Mundial em Barcelona das Nações Unidas visando
superar as barreiras de
limitação de recursos em razão do modelo
da ordem econômica global. Esta proposta visa o
estabelecimento de um acordo internacional entre os países e
os agentes financeiros internacionais para que os
investimentos em saneamento e moradia para as populações
mais pobres – vinculados ao cumprimento das metas do milênio
da ONU - sejam excluídos do conceito de dívida para efeitos
dos cálculos do superávit primário dos países
pobres, devedores e em desenvolvimento.
Para
o avanço da promoção do direito à moradia com base nas
obrigações e compromissos assumidos pelo Estado Brasileiro,
um grave situação que precisa ser enfrentada é o dos
despejos forçados. Pela inexistência de uma política e
medidas que visem solucionar estes conflitos, a seguir
destacamos as diversas situações
existentes de despejos forçados no Brasil, como meio de
contribuir para a identificação das tipologias dos despejos
e apontar caminhos para enfrentar e solucionar os diversos
conflitos sociais que vivenciamos em nosso país.
1.
Deslocamento forçado de populações tradicionais e de baixa
renda para implantação de Megaprojetos
ALCÂNTARA,
MA – PROJETO DE EXPANSÃO DA BASE DE FOGUETES AMEAÇA
DESLOCAR COMUNIDADES QUILOMBOLAS: Ameaça de novos
deslocamentos forçados das comunidades negras rurais
tradicionais quilombolas pela implantação da fase III e IV
de expansão do Centro de Lançamento de Foguetes da Aeronáutica,
que já ocupa cerca de metade do território de Alcântara.
Apesar da Aeronáutica já ter deslocado 1.350 quilombolas
para a implantação da fase I e II do projeto e serem
previstos o deslocamento de mais de 1.500 quilombolas, não há
uma interlocução entre o Grupo Interministerial criado
recentemente para discutir a questão de Alcântara e o
Movimento dos Atingidos pela Base de Lançamento de Foguetes
(MABE) e a organização dos quilombolas locais ou nacionais[6].
Hoje, cerca de 80% da população moradora das palafitas dos
bairros de Camboa e Liberdade na periferia de São Luiz são
quilombolas ou descendentes que perderam suas terras em Alcântara.
PORTO
VELHO, RO – PROJETO DE HIDRELÉTRICAS NO RIO MADEIRA AMEAÇA
DESLOCAR POPULAÇÕES RIBEIRINHAS: Conflito entre o direito da
população ribeirinha permanecer na área em que
tradicionalmente vive, e seu reconhecimento através da
regularização fundiária, e a instalação de duas usinas
hidrelétricas – Santo Antônio e Jirau – por Furnas no
Rio Madeira. O Projeto de Furnas Centrais Elétricas e da
Construtora Norberto Odebrecht, financiado pelo BNDES (Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) pode inundar
500 km² de Floresta Amazônica[7]
entre Porto Velho e Abunã, no entanto, segundo o Fórum
Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e
Desenvolvimento, o inventário elaborado por Furnas não
ofereceu respostas precisas quanto aos impactos que as obras
trarão às populações ribeirinhas, ao patrimônio histórico
e ao meio ambiente.
FORTALEZA,
CE - PROJETO TURÍSTICO
DA AVENIDA COSTA-OESTE EXPULSA PESCADORES DA PRAIA DE
GOIABEIRAS: Goibeiras é uma praia do litoral oeste de
Fortaleza onde vivem pescadores, que praticam a pesca
artesanal como forma de subsistência. É um bairro popular de
ocupação consolidada que está sofrendo grande impacto pela
implantação do projeto de turístico que já iniciou a
construção da Avenida Costa Oeste. Este projeto aplica
dinheiro público para efetuar o despejo forçado da população
de baixa renda que tem direito à regularização fundiária,
para dar lugar a exploração da iniciativa privada. O Estado
e a Prefeitura despejam os pescadores sob a alegação de se
tratar de área de risco, no entanto na lei do Plano Diretor,
em que se denuncia a falta de participação popular,
inclusive pelo Ministério Público Estadual, a área está
destinada para prédios de 15 andares.
SÃO
JOSÉ DOS CAMPOS, SP - PROJETO DE "DESFAVELIZAÇÃO"
DA PREFEITURA RETIRA MORADORES DO CENTRO E OS ABANDONAM NA
PERIFERIA: Ao todo, 606 (seiscentos e seis) famílias foram
atingidas pelo projeto de desfavelização, o que totaliza
cerca de 6.000 (seis mil pessoas). O projeto da Prefeitura se
deu em áreas públicas municipais, federais (como a Favela
Maranhão e Jardim das Indústrias que se estavam em área da
rede ferroviária federal) e particular, como o caso da Vila
Nova Tatetuba que, inclusive, no Plano Diretor da cidade
encontra-se classificada como ZEIS. Os moradores que têm
direito à regularização fundiária no local em que viviam
foram transferidos para longe da infra-estrutura e opções de
emprego da cidade. A Central de Movimentos Populares denuncia
que o projeto tem fins meramente estéticos e paisagísticos
vez que a população carente foi deslocada para longe dos
centros e das áreas valorizadas, acabando com barracos e
outras construções que "enfeiam" a cidade, sendo
criados verdadeiros "campos de concentração" na
periferia, onde predomina a violência, o descaso, o abandono.
2.
Despejo de assentamentos urbanos informais de Sem-Teto
SÃO
PAULO/OSASCO/GUARULHOS, SP - TRIPLO DESPEJO DE INTEGRANTES DO
MOVIMENTO DOS TRABALHADORES SEM TETO (MTST): Em dezembro de
2002, 2.000 famílias que ocuparam um terreno vazio em um área
nobre de Osasco denominada "Parque dos Príncipes"
foram despejadas. Depois de removidas as famílias para um
terreno da CDHU em Guarulhos, pelo próprio Estado, 400 famílias
remanescentes sofreram o 2º despejo fruto de ação civil pública
motivada pela contaminação, movida pelo Ministério Público
Estadual. O despejo se deu de forma violenta, contando com a
presença da polícia militar, da tropa de choque e da guarda
civil de Guarulhos, além de inúmeros tratores. Neste episódio,
além da destruição de barracos, houve, inclusive, denúncia
de agressões físicas. Em 25/9/2003, em função de uma ordem
de reintegração de posse ilegal,
100 famílias remanescentes sofreram o 3º despejo. O
Acampamento Carlos Lamarca em Osasco foi feito em um terreno
do Sérgio Naya com obras embargadas pela Justiça, na ocasião
do despejo foi destruída escola construída pelos moradores,
pessoas (inclusive menores) foram irregularmente detidas, bem
como, sofreram agressões e tiveram seus bens queimados pela
polícia.
3.
Despejo de assentamentos rurais de Sem-Terra
PERNAMBUCO
- ENGENHO PRADO (TRACUNHAÉM) E USINA ALIANÇA (ALIANÇA): Os
engenhos Prado, Papicu, Taquara, Dependência e Tocos abrigam
os conflitos de terra mais tensos do Estado de Pernambuco.
Cerca de 300 famílias sem terra, moram e plantam na área há
mais de 7 anos. Houve dois despejos violentos, um no dia 3 de
julho e o outro no dia 1 de novembro de 2003, a pedido do
Grupo João Santos com a participação da polícia militar.
No dia 25 de novembro os engenhos Taquara, Papicu, Dependência
e Tocos foram desapropriados pelo Presidente Luis Inácio Lula
da Silva. As famílias estão vivendo precariamente em uma
faixa de terra entre a cerca de arame farpado e a rodovia.
Outra zona de grande tensão á a Usina Aliança, situada em
uma área que corta as cidades de Aliança, Timbaúba, Itambé
e Nazaré da Mata. Há 23 engenhos na Usina Aliança, onde
vivem cerca de 1500 famílias e na maioria deles existem
conflitos. O MST denunciou que os trabalhadores estão
sofrendo com a violência de pistoleiros. Informou que os
trabalhadores acampados há 5 anos no Engenho Ajudante sofrem
constantes ameaças e humilhações por parte dos pistoleiros,
que já destruíram várias vezes as lavouras dos
trabalhadores, envenenaram a água que o acampamento consumia
e chegaram a atirar contra os trabalhadores.
4.
Despejo de moradores de Cortiço
SÃO
PAULO – CORTIÇOS DA REGIÃO CENTRAL: Além da situação de
risco à vida e à saúde das condições de habitabilidade a
altas contas de água e luz os moradores de cortiço são
discriminados pelo não reconhecimento de seus direitos pelo
judiciário segundo a Lei de Locação. O temor e ameaças de
despejo impedem o planejamento familiar de investir e melhorar
o lugar em que se mora. A prática do despejo sem garantia de
proteção processual viola o direito de defesa, além de
expor os moradores à violência e ao desabrigo. A falta de
assistência jurídica gratuita dificulta o reconhecimento no
judiciário dos direitos dos encortiçados como locatários ou
sublocatários, impedindo que os moradores possam exigir
legalmente do locador ou intermediário melhorias no imóvel.
A prevenção aos despejos, quando assegurada, ainda tem se
garantido mais pela via processual (ex. alegando a falta de
notificação de todos os moradores nas fases inicial, de
julgamento e execução do despejo) do que pelo reconhecimento
do direito dos moradores de cortiço à proteção jurídica
da moradia.
PRESSUPOSTOS
PARA SOLUÇÃO PACÍFICA DAS SITUAÇÕES DE CONFLITO
Desta
forma, destacamos, dentre as principais diretrizes contidas
nas normas internacionais, as medidas que devem ser adotadas
pelas autoridades brasileiras para a promoção do direito à
moradia, com vista, em especial, a solução pacífica das
situações de conflito. Vejamos.
O
reconhecimento
dos grupos vulneráveis como titulares do direito à moradia,
não podendo ser discriminados em razão da origem social,
posição econômica, origem étnica, sexo, raça ou cor,
devendo ser reconhecidos seu direito à políticas públicas
específicas, bem como, incluídos como beneficiários e
agentes de qualquer projeto de desenvolvimento (em especial
que os atinja diretamente), como forma de garantir tratamento
isonômico na aplicação das normas de proteção dos
direitos humanos instituídas em nosso ordenamento jurídico.
A
democratização do acesso à terra e à propriedade, que
regulem as atividades do setor privado bem como a instituição
dos instrumentos jurídicos e urbanísticos de regularização fundiária para reconhecer o direito à moradia das
populações que vivem nos assentamento informais, através da
instituição de leis sobre política urbana e habitacional,
como são os planos
diretores nos Municípios.
O
direito
à participação:
as populações locais mais vulneráveis devem ser
consultadas, bem como, participar da definição de qualquer
projeto estratégico para a cidade, em especial, no território
que ocupam. As minorias devem atuar como beneficiários e
agentes dos projetos de desenvolvimento (artigo 7º do Decreto
nº 5051 de 2004 que regulamenta a Convenção 169 da OIT[10]).
A participação efetiva é aquela que garante o direito à
informação, devendo ser divulgada, em local e tempo
apropriados, com procedimentos não apenas consultivos, mas
deliberativos e vinculantes.
O
entendimento de que os despejos forçados e demolições de
domicílio como medida punitiva contrariam as normas nacionais
(Constituição Federal, Estatuto da Cidade) e o e
internacionais de que o Brasil é signatário (Pacto
Internacional dos Direitos Civis e Políticos, Convenção de
Genebra de 1949, Protocolos de 1977 e a
Convenção 169 OIT[11]).
A
necessidade de regulamentação
da devida proteção legal às pessoas afetadas pelas ações
de remoção, realocação, despejo de modo que disponham de
recursos jurídicos apropriados para resguardar os seus
direitos como a vida,
integridade física e preservação de seus bens e valores
pessoais.
A
necessidade de se tomar as seguintes medidas na excepcional
ocorrência de despejos forçados, em vista do disposto no
item 14 do Comentário Geral n° 7 do Comitê dos Direitos
Econômicos Sociais e Culturais das Nações Unidas, que
obriga o Estado:
-
antes de realizar qualquer despejo forçado,
especialmente os que envolvem grande grupos de pessoas a
explorar “todas alternativas possíveis”, consultando as
pessoas afetadas, a fim de evitar ou de minimizar o uso da força
ou ainda impedir o despejo;
-
assegurar às pessoas afetadas pelo despejo a utilização
dos remédios legais como o direito de defesa e recurso das
decisões judiciais de despejo;
-
assegurar a todas as pessoas afetadas pelos despejos
forçados o direito à indenização adequada, referente aos
bens pessoais ou reais de que foram privados.
A garantia à proteção processual das pessoas afetadas pelos
despejos forçados de forma a resguardar: o direito de
defesa das pessoas afetadas; concessão de um prazo
suficientemente razoável para notificar todas as pessoas
afetadas com atenção à data prevista para o despejo;
prestar a todos
os interessados, em um prazo razoável,
informação relativa ao despejo previsto e, se for o
caso, o fim a que se destinam as terras e residências; a
presença de funcionários públicos ou seus representantes,
especialmente quando o despejo afete grande número de
pessoas; identificação exata de todas as pessoas que serão
atingidas pelo despejo; a não execução dos despejos quando
haja mau tempo ou seja noite, a oferta de remédios jurídicos;
a prestação de assistência jurídica sempre que possível
às pessoas que necessitem pedir indenização nos tribunais;
ter locais apropriados para a guarda dos bens e utensílios
pessoais das pessoas que serão despejadas; oferta de abrigos
para as pessoas despejadas.
O
respeito às populações tradicionais e seus modos de vida:
De acordo com artigo 16 da Convenção 169 OIT (Decreto nº
5051 19-4-2004) os povos tradicionais, como regra, não podem
ser deslocados das terras que ocupam[12].
Segundo a Convenção o deslocamento depende do “consentimento dos mesmos, concedido livremente e com pleno conhecimento
de causa”. Já o artigo 27 c/c 26
da Convenção Americana de DDHH diz que somente em caso de
“guerra, de perigo público, ou de outra emergência que ameace a
independência ou segurança do Estado-Parte”, os povos
tradicionais podem ser deslocados. Quanto á justa reparação,
os povos deslocados deverão receber terras de qualidade e
estatuto jurídico pelo menos igual às terras que ocupavam
anteriormente, lhes permitindo cobrir suas necessidades e
garantir seu desenvolvimento futuro. A indenização em
dinheiro é apenas subsidiária.
Advogado, Relator Nacional do Direito à Moradia Adequada,
doutor em Direito Urbanístico, professor da PUC/SP e
Coordenador da equipe do Direito à Cidade do Instituto
Polis.
Advogada, Assessora da Relatoria Nacional do Direito à
Moradia Adequada, Voluntária das Nações Unidas UNV/PNUD
e membro da equipe do Direito à Cidade do Instituto
Polis.
De acordo com o Comentário Geral nº4 do Comitê dos
Direitos Econômicos Sociais e Culturais das Nações
Unidas.
O processo da Conferência
Nacional das Cidades
mobilizou cerca de 320 mil representantes da
sociedade e do Poder Público em 3.547 cidades em conferências
municipais e regionais
estaduais de junho a setembro de 2003. O Conselho
Nacional das
Cidades na sua composição de 71 membros
contém 19 representantes de movimentos populares,
14 do poder público federal, seis do poder público
estadual; 10 do poder público municipal, sete dos empresários,
sete dos trabalhadores, cinco das entidades profissionais
acadêmicas e de pesquisa e três de organizações não
governamentais.
Alguns
dos casos de despejo monitorados pela Relatoria Nacional
para o Direito Humano à Moradia Adequada e à Terra
Urbana – do Projeto Relatores Nacionais da Plataforma
Brasileira DhESC - entre 2003/2004.
Respectivamente: ACONERUQ (organização do Maranhão) e
CONAQ (organização nacional).
[7]
“IRRSA – É esta a integração que nós queremos?”,
artigo de Elisangela Soldatelli Paim do Núcleo Amigos da
Terra/Brasil de Dezembro 2003,
http://www.riosvivos.org.br/arquivos/2118962134.pdf
Porque até o presente momento tanto o réu da ação não
fora identificado como não se provou ser a área de que
diz respeito o processo que deu origem a ordem de
reintegração de posse a mesma em que foi cumprida a
ordem de desocupação. Estes fatos foram acompanhadas
pela Relatoria Nacional da Moradia e advogados da comissão
de direitos humanos da OAB/SP.
[9]
Respectivamente à luz dos artigos 2º e 24 da Lei
8245/91.
[10]
Transcrição: “Os
povos interessados deverão ter o direito de escolher
suas, próprias prioridades no que diz respeito ao
processo de desenvolvimento, na medida em que ele afete as
suas vidas, crenças, instituições e bem-estar
espiritual, bem como as terras que ocupam ou utilizam de
alguma forma, e de controlar, na medida do possível, o
seu próprio desenvolvimento econômico, social e
cultural. Além disso, esses povos deverão
participar da formulação, aplicação e avaliação dos
planos e programas de desenvolvimento nacional e regional
suscetíveis de afetá-los diretamente”.
Regulamentado pelo Decreto nº 5051 de 19 de abril de
2004.
De acordo com o artigo 16
da Convenção 169 OIT (Decreto nº 5051 19-4-2004).
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