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Relatórios


O acordo sobre propriedade intelectual conhecido por sua sigla em inglês - Trips, feito junto com outros 12 acordos durante a criação da Organização Mundial do Comércio (OMC), é injusto porque dá monopólio ao titular do conhecimento de produtos essenciais, como alimentos e medicamentos. É o caso do tratamento para a Aids. O Brasil aceitou aplicar o Trips desde o primeiro ano da assinatura, o que o impediu de produzir genéricos e o tornou dependente dos genéricos da Índia. Como a partir de 2005 a Índia também não poderá mais produzir esses medicamentos, os gastos do nosso País com o tratamento de Aids podem passar de R$ 700 milhões ao ano para R$ 3,5 bilhões ao ano, o que pode ser o final da referência do Brasil no tratamento da doença.

  

Acordo feito na OMC ameaça tratamento de Aids no Brasil

* Evanize Sydow

 

 Ao explicar o significado da sigla TRIPS (Trade-Related Aspects on Intelectual Property Rights) durante o simpósio “Sob o Signo das Bios: Tecnologia, ética, política e sociedade”, em setembro passado, no Rio de Janeiro, o professor Cícero Gontijo, da Fundação Getúlio Vargas, trouxe à luz uma situação grave: o tratamento de Aids no Brasil, que é referência mundial, está ameaçado a partir do próximo ano.

 O acordo Trips, feito junto com outros 12 acordos durante a criação da Organização Mundial do Comércio (OMC), em 1994, refere-se ao direito de propriedade intelectual, dando uma série de poderes a grandes empresas que detêm controle de patentes e submetendo muitos países à dependência tecnológica. O acordo foi uma condição imposta por países como os Estados Unidos para seguir com as negociações na OMC, que objetiva regular as atividades de comércio no mundo.

 “Durante mais de oito anos o Brasil se opôs a discutir propriedade intelectual na OMC, mas foi pressionado nas negociações bilaterais”, comenta Cícero Gontijo. O país cedeu e admitiu assinar o acordo. “Na época, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, havia um movimento neoliberal forte. Além de aceitar o Trips, o Brasil fez uma nova lei pior e mais concessiva do que este acordo”, informa o professor.

 Gontijo explica que o Trips é injusto porque dá monopólio ao titular do conhecimento de produtos essenciais, como alimentos e medicamentos. Esse é o caso do tratamento para a Aids. Os países em desenvolvimento que assinaram o Trips tinham um prazo de 10 anos para aplicarem o acordo. E foi o que fizeram, por exemplo, a Índia e a Tailândia, que desenvolveram produtos médicos a preços baixos. O Brasil, por outro lado, aceitou aplicar o Trips desde o primeiro ano de sua assinatura, o que o impediu de produzir genéricos e o tornou dependente dos genéricos da Índia. Como a partir de 2005 a Índia também não poderá mais produzir esses medicamentos, os gastos do Brasil com o tratamento de Aids podem passar de R$ 700 milhões ao ano para R$ 3,5 bilhões ao ano. “Isso pode ser o final da referência do Brasil no tratamento da Aids”, conclui Gontijo.

 O consultor destacou que o tema propriedade intelectual está sendo parte de negociações no mundo inteiro. “O Brasil está negociando propriedade intelectual ao mesmo tempo com a União Européia, na Alca (Área de Livre Comércio das Américas), na Organização Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI), na OMC, e dentro do Mercosul.” Há um ano, no entanto, o governo brasileiro passou a se opor a negociar propriedade intelectual no âmbito da Alca. “E deve fazer a mesma coisa com relação à União Européia, porque ficamos numa situação na qual cada vez que negociamos, temos que ceder mais.”

  

* Evanize Sydow é jornalista da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos