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Relatórios


Comparando os ganhos com reajustes salariais com as perdas salariais devido ‘a rotatividade, no primeiro semestre de 2004 tivemos cerca de 5,1 milhões de trabalhadores contratados e 4 milhões de trabalhadores demitidos. A rotatividade implicou em uma perda salarial média de 40% para os que foram recontratados.

 

BRASIL, SEM TRABALHO POR QUÊ? 

*Paulo César Pedrini

  Neste ano de 2004, apesar de haver uma certa insistência da parte do governo em ressaltar uma ligeira recuperação econômica no país, no que se refere à gestão do trabalho isso não foi sentido de maneira significativa. Buscaremos aqui trazer alguns elementos que nos levaram à esta conclusão.

 No campo das negociações salariais, o primeiro semestre de 2004 traz um saldo favorável nas negociações salariais de data-base.  Cerca de 80% apontaram percentuais de reajustes iguais ou superiores às variações acumuladas do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para cada data-base.

 Essa Conclusão é do DIEESE – Departamento  Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos,  a partir da análise das informações cadastradas no SAS – Sistema de Acompanhamento de Salários.

 A pesquisa indica que 47% das negociações resultaram em ganhos reais para os trabalhadores, ou seja, fixaram índices  de reajuste superiores aos percentuais necessários à reposição de perdas salariais em cada data base, segundo o INPC-IBGE.  Em 21% dos eventos, o reajuste conquistado foi inferior, e em 32% exatamente igual a esse indicador.

 Essa recuperação das negociações salariais se explica, em parte, pela reversão de vários aspectos macro-econômicos negativos que dificultaram as negociações salariais no ano anterior. As perdas salariais registradas em 2003, juntamente com a recuperação econômica em curso, foram os grandes argumentos utilizados pelos trabalhadores na mesa de negociação.

 Cerca de 25% dos trabalhadores de nível superior estão fora do mercado de trabalho. Isso mostra claramente que é falso acreditar que o desemprego atinja somente aqueles que supostamente não se preparam para as mudanças no mundo do trabalho de hoje e, conseqüentemente, não estão atendendo às exigências do mercado.  Com isso, vemos que o desemprego hoje atinge todas as camadas sociais, o que não ocorria anteriormente.

 Outro dado importante é que em face da grande quantidade de força de trabalho disponível, os trabalhadores estão sendo contratados ganhando cerca de 15% a menos, ou seja, por haver um imenso contingente de desempregados, os empregadores pagando um salário menor pelo mesmo tipo de trabalho.

 Comparando os ganhos com reajustes salariais com as perdas salariais devido ‘a rotatividade, no primeiro semestre de 2004 tivemos cerca de 5,1 milhões de trabalhadores contratados e 4 milhões de trabalhadores demitidos. A rotatividade implicou em uma perda salarial média de 40% para os que foram recontratados.

 Existe hoje uma consciência de que o mercado de trabalho passou por profundas transformações: o fechamento de milhões de postos de trabalho, de modo particular na indústria e na agricultura mecanizada, a precarização do emprego e sua transferência para o mercado informal com total insegurança, além da ausência de amparo da legislação trabalhista.

 Além disso, o mercado de trabalho formal está sob a ameaça da “flexibilização” e reforma das leis trabalhistas.  A proposta de reforma apresentada pelo Fórum Nacional do Trabalho (FNT) contém perdas significativas para os trabalhadores brasileiros.

 No que se refere às mudanças no sistema de relações de trabalho (negociação/contratação), os acordos poderão ser negociados pelas centrais e confederações sem a necessidade de aprovação na base da categoria, ou seja, um sindicalismo de cúpula.  E nessas negociações poderão ser eliminados até direitos garantidos por lei. A negociação estaria acima da própria legislação trabalhista. No campo das mudanças na representação  sindical, o estado poderá estabelecer “estatutos padrão” além de definir critérios para a existência e representatividade dos sindicatos. 

 A representação derivada permite às centrais construir sindicatos na base dos “sindicatos rebeldes” e o mais grave, restabelece o poder do Ministério do Trabalho para intervir nos sindicatos, ou seja, um retrocesso no que se refere à autonomia sindical.

 Quanto à arrecadação, o imposto sindical que hoje é 3,3% de um salário mensal poderá passar a ser contribuição negociada que pode alcançar até 13% de 1 salário mensal (1% do salário liquido anual).

 Outro ponto autoriza a contratação de substitutos para grevistas. A proposta restringe o direito de greve e abre caminho para que o negociado prevaleça sobre o direito.  Sendo assim, a negociação estaria acima da legislação trabalhista, o que faz com que o trabalhador, sob a ameaça de desemprego, aceite a perda de direitos.

 Por tudo isso, consideramos a reforma sindical proposta pela FNT um retrocesso sem precedentes para a classe trabalhadora, já que ela estabelece o fortalecimento das centrais sindicais com o enfraquecimento dos sindicatos de base. Ou seja, reduz de maneira significativa a autonomia sindical, uma bandeira histórica da classe trabalhadora.

 É necessário informar, mobilizar e organizar a luta contra a proposta do FNT, que é visivelmente contrária aos interesses da classe trabalhadora.

 Apesar do quadro de desemprego ser complexo, existem saídas que implicam num real comprometimento do governo em criar políticas de geração de empregos.

 Por exemplo, muito se fala em crescimento econômico. Entretanto, crescimento econômico sem distribuição de renda não gera inclusão social. A redução de jornada de trabalho, somada ao fim de horas extras, geraria não somente mais empregos, como também melhor qualidade de vida para os trabalhadores. O Brasil tem enorme potencial para geração de empregos, sobretudo se investir maciçamente na demanda de problemas sociais, como na construção de escolas e hospitais, em saneamento básico e em moradias populares. A reforma agrária também poderia gerar milhões de postos de trabalho.

 Porém, tudo isso requer uma ação efetiva do Estado em assumir sua responsabilidade na construção de um país justo. Cabe aqui questionar se isso é possível enquanto houver o envio de uma imensa quantidade de dinheiro público para o pagamento dos juros da dívida externa.

 O governo Lula tem como meta aumentar ainda mais o superávit primário, sendo que hoje ele já é superior ao do governo FHC. O PT  criticou tanto o PSDB por sua política econômica e agora mantém e até acentua essa política.

 Conforme nota dos bispos brasileiros (CNBB), em sua mensagem para o 1° de Maio, no Dia Internacional da Classe Trabalhadora: “O credores podem esperar, os desempregados não”. 

  

*Paulo César Pedrini – Historiador e Coordenador da Pastoral Operária Metropolitana de São Paulo.