Tem
crescido o número de casos de despejos e deslocamentos forçados
oriundos de reintegrações de posse. O mais grave foi o caso
ocorrido no mës de fevereiro de 2005, no Parque Oeste
Industrial, no Assentamento Sonho Real, na cidade de Goiania,
que gerou duas
mortes e 24 feridos (informações oficiais do dia 16 de
fevereiro de 2005). A remoção e a destruição das moradias
de aproximadamente 4
mil famílias e a formação de uma favela no entorno do ginásio
esportivo destinado a abrigar
provisoriamente a população removida. Outra situação
que destacamos é o impacto social dos casos de despejos
ocorridos nos meses de agosto e setembro de 2005 em imóveis ocupados por
movimentos de moradia na área central da cidade de São
Paulo, que resultou pela
população despejada na formação de
uma favela
nas Ruas Plínio Ramos e Mauá, no centro da cidade.
Por
um
Plano Nacional de Combate aos Despejos e Deslocamentos ForÇados
e de ProteÇÃo do Direito Humano A Moradia Adequada e do
Direito À Cidade
Nelson
Saule Júnior*
Leticia
Osorio**
Patricia
de Menezes Cardoso***
I-
Necessidade de Enfrentar a Questão dos Despejos e
Deslocamentos Forçados
O
novo milênio aponta para um crescimento mundial da população
vivendo nas cidades, considerando que
a metade da população mundial vive em aglomerados
urbanos. Previsões chegam a estimar que em 2050 a taxa de
urbanização no mundo chegará a 65%. As cidades como territórios de grande riqueza e diversidade
econômica, ambiental, política e cultural serem governadas
de forma democrática de modo que sejam respeitados os
direitos de seus habitantes são um desafio para a humanidade
neste novo milênio.
Nossas
vivências nas
cidades, buscando serem criadas condições para vivermos em
harmonia, paz e felicidade, tem combatido, os modelos de
sociedade com elevados padrões
de concentração de riqueza
e de poder, que são usufruídos por um reduzido número
de pessoas e aglomerados econômicos, bem como tem enfrentado
os processos acelerados de urbanização que contribuem para a
depredação do meio ambiente e para a privatização do espaço
público, gerando empobrecimento, exclusão e segregação
social e espacial.
As
cidades como espaço social que ofereçam
condições e oportunidades eqüitativas aos seus
habitantes de viverem com dignidade, independente das características
sociais, culturais, étnicas, de gênero e idade, felizmente
continuam sendo o
objetivo de muitos indivíduos, grupos sociais, organizações
da sociedade, movimentos populares, instituições religiosas,
partidos políticos, gestores públicos, compromissados em alcançar um vida composta de felicidade,
paz, harmonia e solidariedade para as pessoas humanas nas
cidades.
Para
a existência de cidades, justas, humanas, saudáveis e democráticas
é preciso incorporar os
direitos humanos no
campo da governança
urbana, da gestão e das políticas públicas, visando a obtenção
de resultados de impacto à eliminação das desigualdades
sociais, às praticas de discriminação em todas as suas
formas da segregação de
indivíduos, grupos sociais e comunidades
em razão do tipo de moradia
e localização dos assentamentos em que vivem.
O
controle da sociedade sobre as políticas públicas e
megaprojetos de desenvolvimento – como o de requalificação
de centros
urbanos, ampliação de aeroportos, que geram grande impacto
social e resultam, na maioria das vezes, em obstáculos e
violações aos direito à moradia e ao direito à cidade
sustentável - tem sido um grande desafio para diversos atores
compromissados com um mundo mais justo, solidário e pacífico.
Em
diversas regiões do mundo são muitas as
experiências de lutas sociais para modificar os modos
de governar, planejar e desenvolver as cidades, de modo que os
seus habitantes se apropriem e usufruam a riqueza tanto no
aspecto econômico como também na produção do conhecimento
e da cultura. Estas experiências e iniciativas de grupos e
segmentos da sociedade que tem como paradigma
os direitos humanos precisam se tornar referências
para os organismos internacionais, governos nacionais e
locais.
Com
relação ao processo
de construção de cidades justas, humanas, saudáveis e
democráticas no
Brasil destacamos a necessidade do Estado Brasileiro enfrentar
com responsabilidade e seriedade a questão dos despejos e
deslocamentos forçados que
tem ocorrido em várias
cidades brasileiras.
A organização internacional de proteção do direito
à moradia COHRE tem apontado como
a questão dos despejos é grave em várias regiões do mundo,
documentando casos envolvendo cerca de 4,3 milhões de pessoas
em 63 países que foram despejadas forçadamente de suas casas
no período de 1998-2000. Freqüentemente esses despejos são
acompanhados de violência severa, com vítimas detidas,
presas, machucadas, torturadas e, em alguns casos, até
mortas. Poucas nações em exceção – incluindo fortes
defensoras dos direitos humanos onde o governo da lei
prevalece – têm tido sucesso na proteção da
multiplicidade de pessoas que ilegalmente, arbitrariamente ou
injustamente são despejadas.
Tem
crescido o número de casos de despejos e deslocamentos forçados
oriundos de reintegrações de posse. O mais grave foi o caso
ocorrido no mës de fevereiro de 2005, no Parque Oeste
Industrial, no Assentamento Sonho Real, na cidade de Goiania,
que gerou duas
mortes e 24 feridos (informações oficiais do dia 16 de
fevereiro de 2005). A remoção e a destruição das moradias
de aproximadamente 4
mil famílias e a formação de uma favela no entorno do ginásio
esportivo destinado a abrigar
provisoriamente a população removida. Outra situação
que destacamos é o impacto social dos casos de despejos
ocorridos nos meses de agosto e setembro de 2005 em imóveis ocupados por
movimentos de moradia na área central da cidade de São
Paulo, que resultou pela
população despejada na formação de
uma favela
nas Ruas Plínio Ramos e Mauá, no centro da cidade.
Tem
sido uma preocupação constante de diversas organizações não-governamentais
e movimentos sociais que participam do Fórum Nacional de
Reforma Urbana o aumento sistemático de despejos forçados de
populações de baixa renda que vivem em áreas informais de
moradia em todo o país, empreendidos pelos governos federal,
estadual e municipal, por proprietários e empresas privadas e
por políticas de desenvolvimento financiadas pelos Bancos
Mundial, Interamericano de Desenvolvimento e governo federal.
Em
18 de marco de 2005, o Conselho das Cidades aprovou a Resolução
No. 31 que propõe o estabelecimento de um processo de discussão
entre os órgãos do Poder Judiciário e instituições
essenciais à justiça e o Conselho das Cidades no que tange
à atuação do Judiciário em conflitos relativos aos
deslocamentos e despejos de grande impacto social, e também a
criação de um grupo no âmbito do Comitê Técnico de Habitação
com a participação de representantes do Comitê de
Planejamento Territorial Urbano, com a finalidade de mapear os
conflitos relativos a deslocamentos e despejos no país e a
sugerir soluções estruturais.
Esta
responsabilidade em formular um plano nacional para atuar nas
situações de despejos e deslocamentos deve ser
principalmente do Conselho Nacional de Justiça.
Para
viabilizar o combate às violações do direito à cidade e o
direito à moradia decorrente do aumento sistemático de
despejos de população de baixa renda, apresentamos a seguir
um conjunto de medidas que entendemos serem necessárias,
visando a prevenção de despejos forçados no Brasil, tendo
por base a legislação internacional de direitos humanos.
Os
Estados que ratificaram o Pacto Internacional de Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais (PIDESC), como é o caso do Brasil, estão
obrigados a “utilizar todos os meios apropriados para
promover e defender o direito à moradia e proteger contra
despejos forçados”. Isso pode ser atingido por um conjunto
de ações visando a revisão da legislação nacional de
forma a melhor compatibilizá-la com os princípios e normas
internacionais de direitos humanos, da Constituição Federal
e do Estatuto da Cidade (Lei Federal n. 10.257/2001). A
compatibilização da legislação nacional tem o objetivo de
proibir a prática de despejos forçados e violentos e propor
proteções processuais para garantir proteção e consulta à
população afetada.
Como
premissa para a adoção dessas medidas
é de
observar o Comentário
Geral No. 7 sobre o Direito à Moradia (E/C.12/1997/4)
das Nações Unidas
relativo ao Pacto internacional dos DHESC. Este comentário
constitui-se
na interpretação legal principal sobre o direito de ser
protegido contra despejos forçados adotado pelo Comitê DESC
em 1997. Esse Comentário detalha o que os governos, proprietários
e instituição devem fazer para prevenir despejos forçados:
-
Os despejos forçados são incompatíveis com os
dispositivos do PIDESC;
-
Um
despejo forçado é a “remoção permanente ou temporária
de indivíduos, famílias e/ou comunidades, contra sua
vontade, das casas e/ou terras que ocupam. A proibição de
despejos forçados não se aplica, entretanto, aos despejos
implementados pela força de acordo com a lei e em
conformidade com as disposições dos Tratados e Pactos de
Direitos Humanos“;
-
Os
despejos forçados em geral violam outros direitos humanos,
tais como o direito à vida, o direito à segurança da
pessoa, o direito à não-interferência na privacidade, família
e moradia, e o direito ao exercício pacífico de suas posses.
-
Antes de implementar qualquer tipo de despejo, os
governos devem assegurar que todas as alternativas viáveis
foram exploradas em processos de consulta às pessoas
afetadas, com a visão de evitar ou, no mínimo, minimizar o
emprego da força.
-
Remédios ou processos legais devem ser
providenciados para aqueles afetados por ordem de despejos;
-
Os governos devem assegurar que todos os indivíduos
afetados têm direito à compensação adequada de toda
propriedade ou posse afetada;
-
Nos casos em que os despejos são considerados
justificáveis, eles devem ser implementados em estrito
cumprimento das provisões da legislação internacional de
direitos humanos e de acordo com os princípios de
razoabilidade e proporcionalidade;
-
Os despejos não podem resultar em indivíduos sem
moradia ou vulneráveis a violações de outros direitos
humanos, e quando aqueles afetados não puderem encontrar uma
solução por eles próprios, o Estado devem adotar as medidas
adequadas, utilizando o máximo dos recursos disponíveis para
assegurar alternativas adequadas de moradia, reassentamento ou
acesso à terra produtiva.
II - Propostas
e Recomendações ao Grupo de Trabalho do Conselho das Cidades
e ao Conselho Nacional de Justiça
1.
Da atuação do Grupo de Trabalho
a)
O Grupo de Trabalho deverá propor ações e discussões
abrangendo órgãos e instâncias das Nações Unidas (UN
Habitat, UNDP, Relatoria Especial da Moradia Adequada), os
governos estaduais e municipais, órgãos do governo federal
(Ministério da Justiça, Secretaria Especial de Direitos
Humanos, Secretaria do Patrimônio da União, Secretaria
Especial de Políticas Públicas de Inclusão Racial,
Secretaria Especial dos Direitos da Mulher, Ministério do
Desenvolvimento Agrário, Ministério de Minas e Energias,
Ministério do Meio Ambiente, INCRA, FUNAI), órgãos do Poder
Judiciário (Ministério Público Federal, Ministério Público
Estadual, Corredorias-Gerais de Justiça, Defensorias Públicas,
justiça federal e estadual), as organizações não-governamentais
e os movimentos sociais.
b)
O Grupo de Trabalho deve ser responsável por propor,
recomendar e monitorar políticas e ações de prevenção aos
despejos forçados aos órgãos, instituições e movimentos
acima indicados.
c)
O Grupo de Trabalho deve realizar reuniões de planejamento e
avaliação e produzir relatórios semestrais sobre as suas análises
e atividades relativas à prevenção dos despejos forçados.
d)
O Grupo de Trabalho deve ser constituído por representantes
de ONGs, movimentos sociais, governo federal (mínimo Ministério
das Cidades e SEDH) e setor privado. Uma equipe de assessoria
técnica do Ministério das Cidades deverá trabalhar em
conjunto com o Grupo de Trabalho, desempenhando um papel ativo
nas ações e políticas de prevenção de despejos a ser
implementado pelo Ministério e Conselho das Cidades.
e)
O Grupo de Trabalho poderá convidar para participação em
discussões específicas e relevantes representantes da
sociedade civil, de movimentos sociais, organizações não-governamentais,
setor privado.
2.
Das atividades e ações a serem implementadas pelo Grupo de
Trabalho e equipe técnica do Ministério das Cidades
a)
Junto aos órgãos do governo federal com interface na temática
dos despejos forçados
·
Levantamento das áreas de propriedade da União e
órgãos da administração direta e indireta cujos ocupantes
que se constituem em famílias de baixa renda estão sofrendo
ações de despejos, visando a proposição de soluções
negociadas que respeitem o direito à moradia das famílias
afetadas para serem apresentadas nos respectivos processos
administrativos ou judiciais;
·
Levantamento dos despejos sendo executados pela CEF
contra mutuários por inadimplência, contrato de gaveta ou
ocupação sem título, visando a proposição de soluções
negociadas que respeitem o direito à moradia das famílias
afetadas para serem apresentadas nos respectivos processos
administrativos ou judiciais;
·
Receber denúncias e informações de despejos sendo
implementados contra populações de baixa renda em situação
de ocupação irregular, loteamento clandestino, conjunto
habitacional, cortiços, comunidades tradicionais de quilombos
e indígenas, identificar os órgãos envolvidos e propor soluções
e recomendações para evitar os despejos.
·
Propor que o Fundo Nacional de Moradia preveja
recursos para desapropriação ou compra de áreas visando à
solução de conflitos fundiários em áreas em litígio e/ou
o reassentamento adequado das famílias de baixa renda
afetados, em parceria com os Estados e Municípios.
·
Propor políticas específicas para a prevenção de
despejos forçados contra mulheres, crianças, grupos vulneráveis
e minorias étnicas, raciais e sexuais.
b)
Junto aos Estados e Municípios
·
Inserir como requisito dos Planos de Trabalho do
Ministério das Cidades para acessar recursos do OGU, quando
houver relação com o objeto, a formulação de políticas e
instrumentos para prevenção de despejos forçados.
·
Informar a existência dos Grupos de Trabalho e suas
competências, incentivando Estados e Municípios a constituir
equipes técnicas para prevenção e monitoramento de despejos
forçados.
c)
Junto ao Poder Judiciário
·
Realizar um seminário/oficina de discussão com as
Associações de Procuradores Federal e Estaduais, Associações
de Juízes, Corregedorias-Gerais de Justiça dos Tribunais
Estaduais, Conselho Federal da OAB e Associação de
Defensores Públicos para discutir a adoção de resoluções/recomendações/provimentos
que visem a implementação de regras processuais civis e
penais que asseguram a proteção do direito à moradia da
população de baixa renda ameaçada de despejos, de forma a
garantir: defesa legal, assessoria jurídica gratuita, não
concessão de liminares sem ouvida da comunidade afetada, não
realização do despejo em condições adversas, garantir citação
e intimação pessoal das partes afetadas, informação aos
governos federal, estadual e municipal sobre o despejo, de
forma a buscar alternativa adequada de reassentamento etc.
·
Difundir e ampliar o conhecimento sobre a legislação
internacional de direitos humanos, em especial os dispositivos
que tratam do direito à moradia adequada e proteção aos
despejos forçados constantes dos Tratados e Pactos
Internacionais de Direitos Humanos e sua aplicabilidade, no
meio jurídico, Poder Judiciário, Faculdades de Direito e
entidades de advogados.
d)
Junto à sociedade civil
·
Monitorar e propor soluções para os despejos forçados
em conjunto com a Relatoria Nacional do Direito à Moradia
Adequada, o FNRU, os movimentos sociais, os Conselhos
Estaduais e Municipais das Cidades.
e)
Junto aos organismos das Nações Unidas e OEA
·
Realizar um levantamento de todos os casos de
despejos forçados do Brasil relatados/denunciados aos
organismos das Nações Unidas e OEA, em conjunto com a SEDH e
Ministério das Relações Exteriores, visando identificar os
casos pendentes.
·
Fornecer informações sobre despejos forçados aos
órgãos do governo federal incumbidos de elaborar relatórios
sobre a situação dos DESC no país.
·
Realizar discussões sobre a prevenção de despejos
forçados com órgãos da ONU e OEA, em especial: UN
Habitat/Rio, UN Habitat - Advisory Group on Forced Evictions,
Relator Especial da ONU para a Moradia Adequada.
3.
Do processo de discussão social do tema dos despejos forçados
a)
Incluir nas discussões dos planos diretores – aplicação
de instrumentos e políticas não podem resultar em despejos
forçados e pessoas/comunidades sem moradia ou sem terra.
b)
Incluir no processo de Conferência das Cidades, nos temas da
segurança da posse e da política habitacional.
c)
Incluir como item de discussão nos Cursos de Capacitação de
Planos Diretores Participativos em implementação pelo Ministério
das Cidades.
III -RECOMENDAÇÕES AOS MUNICÍPIOS
Os municípios devem adotar as seguintes medidas visando o
estabelecimento de garantias legais e políticas de prevenção
de despejos forçados:
a)
Integrar-se com o Grupo de Trabalho
constituído pelo Conselho das Cidades/ Ministério das
Cidades para propor ações e discussões abrangendo os
governos estaduais e municipais, órgãos do governo federal,
órgãos do Poder Judiciário (Ministério Público Federal,
Ministério Público Estadual, Corredorias-Gerais de Justiça,
Defensorias Públicas, justiça federal e estadual), as
organizações não-governamentais e os movimentos sociais.
b)
Constituir grupos de trabalho interdisciplinar e equipes técnicas
para discutir políticas e ações de prevenção e
monitoramento de despejos forçados. Capacitar os funcionários
públicos municipais e os integrantes de conselhos municipais
de discussão/formulação de políticas públicas sobre os
temas do direito à moradia e prevenção de despejos forçados.
c)
Difundir e ampliar o conhecimento sobre a legislação
internacional de direitos humanos, em especial os dispositivos
que tratam do direito à moradia adequada e proteção aos
despejos forçados constantes dos Tratados e Pactos
Internacionais de Direitos Humanos e sua aplicabilidade, no
meio jurídico, Poder Judiciário, Faculdades de Direito e
entidades de advogados.
d)
Divulgar junto à sociedade, especialmente junto aos setores
mais pobres e vulneráveis à remoções, a legislação
nacional, especialmente o Estatuto da Cidade e na Medida
Provisória 2.220/2001,
como forma de garantia do direito à moradia adequada.
Recomenda-se a utilização de meios tais como a confecção e
distribuição de material impresso (cartilhas, folhetos,
etc.),"releases" e inserções em rádios, televisões
e jornais, etc. e atenção especial à sensibilização dos
grandes meios de comunicação existentes no município para o
tema.
e)
Realizar um levantamento de todos os casos de despejos forçados
em andamento no município, mediante consulta ao Poder Judiciário
e Ministério Público.
f)
Incluir nas discussões dos planos diretores medidas para
assegurar que a aplicação de instrumentos, políticas e
financiamentos públicos não podem resultar em despejos forçados
e pessoas/comunidades sem moradia ou sem terra.
g)
Incluir o tema da prevenção dos despejos no processo de
Conferência das Cidades, nos temas da segurança da posse e
da política habitacional.
h)
Dialogar com outras instâncias federais e estaduais e com a
sociedade civil organizada, sobre medidas e políticas a serem
adotadas para a prevenção de despejos forçados.
IV -
Proposta Preliminar para Discussão de Projeto de Lei Estadual
para a Criação de Comissão de Prevenção de Conflitos
Fundiários (CPCONF)
Art.
1º - O
Poder Executivo Estadual criará com o objetivo de prevenir e
conciliar conflitos fundiários que dêem ensejo a prática de
desocupações forçadas de assentamentos informais de famílias
de baixa renda que estejam garantindo o cumprimento da função
social da propriedade de imóvel urbano ou rural, público ou
particular.
§1º
– Desocupação Forçada é
a remoção permanente ou temporária de indivíduos, famílias
e/ou comunidades, contra sua vontade, das casas e/ou terras
que ocupam, decorrente de ações judiciais e administrativas,
como ações possessórias movidas por particulares ou entes públicos,
implementação de projetos públicos de intervenção urbana
ou de grande impacto socioambiental.
§2º
– As desocupações implementadas pela força de acordo com
a lei, de
acordo com os princípios de razoabilidade e
proporcionalidade,
e em conformidade com as disposições dos Tratados e Pactos
de Direitos Humanos não são consieradas desocupações forçadas.
Art. 2º – A
Comissão de Prevenção de Conflitos Fundiários (CPCONF) tem
como atribuições:
I
- discutir e propor alternativas para a garantia do direito à
moradia adequada dos afetados mediante o atendimento
habitacional, acesso
à terra ou reassentamento adequado
das famílias, de forma a evitar a piora em sua qualidade de
vida e a garantir a concretização dos Direitos Humanos;
II
-
assegurar que todas as alternatives viáveis foram exploradas
em processos de consulta às autoridades competentes e pessoas
afetadas
para a solução pacífica do conflito, bem como para
evitar ou minimizar o emprego da força.
III
–
emitir recomendações de ofício às autoridades competentes
quanto às alternativas deliberadas pela Comissão,
devidamente motivadas por parecer, a fim de prevenir a prática
de desocupações forçadas e garantir o cumprimento da função
social da propriedade.
IV
– providenciar o acesso à justiça gratuita ao grupo
afetado, garantindo a todos os indivíduos afetados o direito
à compensação adequada de toda propriedade ou posse
afetada;
Art. 3º –
A CPCONF deverá atuar nos casos em que os afetados não
puderem encontrar
uma
solução habitacional ou fundiária por eles próprios,
por sua condição de vulnerabilidade
no
que diz respeito a renda, raça, genêro, faixa etária, e
outras circunstâncias que justifiquem
o
interesse público na defesa do direito à moradia adequada do
grupo afetado.
§1º
- Por solicitação de qualquer parte interessada no processo,
serão encaminhadas à CPCONF cópias, ou qualquer outra forma
de comunicação do processo contendo o número do processo e
da Vara, das ações possessórias e processos administrativos
relacionadas a assentamentos rurais e urbanos;
Art.4º
-
A
CPCONF será composta por 10 membros indicados dos seguintes
segmentos:
I
- 3 membros do Governado do Estado, sendo 1 representante da
Secretaria Estadual de Habitação, 1 do Instituto de Terras
do Estado de São Paulo - ITESP e 1 membro da Casa Civil (Secretaria
de Segurança Pública),
II
- 1 membro indicado pelo Poder Judiciário,
III
- 1 membro indicado pelo Poder Legislativo,
IV
- 1 membro indicado pelo Ministério Público,
V
- 1 membro indicado pela Defensoria Pública do Estado de São
Paulo,
VI
- 1 membro indicado pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil),
VII
- 1 membro indicado pelo CONDEPE (Conselho Estadual de Defesa
dos Direitos da Pessoa Humana),
VIII
– 2 membros indicado pelos movimentos sociais, sendo um do
segmento urbano e outro do rural;
§1º
- A CPCONF
contará com apoio técnico do Governo Federal, do Estado e
das Prefeituras do Estado de São Paulo, por meio dos órgãos
que atuam na resolução dos problemas de assentamentos rurais
e os problemas ligados à habitação e desenvolvimento
urbano;
Art.
5º –
A CPCONF
elaborará parecer sobre a ação possessória no prazo máximo
de trinta dias (30 dias) e encaminhará cópias dos
respectivos pareceres:
I
– Ao Magistrado competente;
II
– Ao Governador do Estado;
III
– Ao Secretário de Segurança Pública;
Parágrafo único: O parecer de que trata esse artigo
tem o objetivo de contribuir para o respeito aos direitos dos
envolvidas no processo recomendando a melhor alternativa para
a solução pacífica do conflito.
Art. 6º -
Havendo decisão de desocupação de áreas ou despejos de famílias
e requisitada
a
força policial para tanto pelo Poder Judiciário, o Poder
Executivo comunicará de imediato
e
antes do efetivo cumprimento da reintegração:
I
- ao Prefeito do município em que se situar o conflito;
II
- à Câmara Municipal do município em que se situar o
conflito;
III
- ao Conselho municipal de Direitos Humanos;
IV
- ao Conselho estadual de Defesa dos Direitos Humanos;
V
- à Comissão
de Direitos
Humanos da
Assembléia Legislativa.
VI-
ao Conselho Tutelar responsável pela região na qual se dá o
conflito;
VII
– ao Conselho Municipal do Idoso do município em que se der
o conflito, quando houver;
VIII-
ao Conselho Municipal da Habitação do município em que se
situar o conflito, q
uando
houver.
Art. 7º -
Na comunicação
de que trata o art.
6º, serão indicados:
I
- a
comarca, o
juízo e o número da
ação em
que foi
determinada o deslocamento
das
famílias, bem como o nome das partes;
II
- o número exato ou aproximado de famílias instaladas
na área a ser desocupada;
III
- a
data e
a hora
em que deverá ser
realizada a
desocupação;
IV
- a
identificação das unidades policiais que atuarão no auxílio
ao cumprimento
da
ordem judicial.
Art.
8º -
Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art.
9º -
As despesas decorrentes dessa lei correrão por dotações orçamentárias
próprias.
Esta
proposta esta ainda em fase de elaboração.
*
Nelson Saule Junior, coordenador da equipe do Direito a Cidade
do Instituto Polis e membro da coordenação
do Fórum Nacional de Reforma Urbana
**
Letícia Osório, representante do Cohre Américas e membro do
Grupo de Especialistas da ONU em Despejos Forçados
***
Patrícia de Menezes Cardoso, advogada da equipe do Direito a
Cidade do Instituto Polis e assessora da Relatoria Nacional
pelo Direito Humano a Moradia Adequada
|