10. África do Sul
Foto:
Georges Gobet/AFP
População:
40,4 milhões (2000)
Área geográfica: 1.223.201
km2
Forma de Governo: República
presidencialista
A
persistente concentração fundiária baseada
na segregação racial na África do Sul
será resolvida por uma reestruturação
total do programa de reforma agrária ou por uma transformação
radical nas relações de propriedades pelo próprio
povo. Os rumos do país dependem da imediata e urgente
resposta do governo às necessidades e demandas de 19
milhões de sem terra.
Setenta por cento dos pobres da África estão
na área rural. Em 1995, 48% da população
vivia em áreas rurais. O país tem uns dos piores
indicadores sociais. Noventa e cinco por cento dos pobres
são negros. A pobreza, portanto, está ligada
às áreas rurais e tem forte relação
com a questão racial.
A renda per capita do negro é de 271 dólares,
enquanto que a do branco é de 3.207 dólares.
A renda média mensal do negro é de 28 dólares,
enquanto que a do branco é de 505 dólares.
O cenário de apartheid colocou 87% das terras nas mãos
de 60 mil fazendeiros brancos e do Estado. Ao mesmo tempo,
milhões de negros tentam sobreviver em condições
de super povoamento nos 13% restantes. São 7 milhões
de trabalhadores e colonos nas fazendas dos brancos.
Breve
histórico
A
segregação racial na África começou
em 1658, quando os Khoi foram impedidos de continuar habitando
os territórios a Oeste dos rios Salt e Liesbeck, e
prosseguiu no século 19 ao serem criadas as primeiras
reservas pelos governos britânico e bôer.
Em 1913, com a Lei de Terras Nativas, 10% das terras foram
reservadas aos negros. A Lei de Promoção de
Auto Governo Bantu criou o Bantustão em 1959 e determinava
que as reservas seriam dos negros sul-africanos. No começo
dos anos 60, estabeleceram-se os primeiros campos de reassentamento
para abrigar posseiros expulsos, agricultores indesejados
e populações urbanas desempregadas.
As leis de terra, o planejamento de colônias e as remoções
forçadas contribuíram para superpovoar as terras
das populações negras. Estima-se que mais de
3,5 milhões de africanos tenham sido removidos e realocados
nas terras natais e cidades negras, entre 1960 e 1980.
A expropriação de terras da população
negra do país deveu-se a necessidade de reduzir a competição
com os agricultores brancos e criar uma reserva de mão-de-obra
barata para trabalhar nas fazendas, nas minas e na indústria.
A Constituição Sul-Africana de 1996 incluiu
cláusulas de direitos fundamentais sobre a reforma
agrária. Apesar disso, o Estado tem demonstrado falta
de vontade política em priorizar a reforma agrária.
O governo sul-africano se comprometeu com uma política
macroeconômica conservadora, detalhada em 1996 no documento
Estratégia de Crescimento, Emprego e Distribuição,
que prioriza a expansão industrial, das exportações
e dos investimentos estrangeiros diretos.
O
modelo do Banco Mundial
Orientado
pelo Banco Mundial, o governo iniciou a implementação
de um complexo pacote de medidas para a reforma agrária.
Sua política tem três componentes: Restituição
de terras, Redistribuição de terras e Reforma
na Posse de Terras.
Mas esse modelo é orientado pelo mercado. Dessa forma,
utiliza as forças de mercado para redistribuir terras
e se baseia amplamente nos princípios de compra e venda
voluntária. O modelo orientado ao mercado tem como
pressuposto a "eficiência", afim de assegurar
ou até mesmo aumentar os níveis de produção,
bem como a manutenção ou melhoria da "confiança
dos investidores".
Geralmente, cinco critérios são utilizados para
julgar a eficiência das políticas e decisões
relacionadas à alocação de recursos do
Banco Mundial. Quatro deles se relacionam à eficiência
do sistema econômico, enquanto o quinto é relacionado
à eqüidade. A terra pode ser redistribuída
tanto com objetivos de eficiência como de eqüidade.
Eficiência e eqüidade são termos economicamente
opostos e freqüentemente confundidos em diversos documentos.
Ambos não podem ser alcançados simultaneamente
em qualquer redistribuição.
Até o final de 2001, menos de 2% das terras haviam
sido transferidas para a população negra através
do programa de reforma agrária. Das 68.878 petições
recebidas para restituição de terras, apenas
12.678 foram julgadas, beneficiando menos de 40 mil domicílios
urbanos, dos quais cerca de 40% receberam compensação
monetária em vez da restauração de terras.
Apesar da compensação monetária ser uma
forma de reparação, ela não se caracteriza
como reforma agrária, pois não envolve a transferência
de direitos sobre a terra.
Diante do fracasso, o Banco Mundial lança um outro
programa em 2001. O público-alvo eram os produtores
"eficientes", isto é, a classe média
formada por fazendeiros negros. Como tinham que dar uma colaboração
mínima de 500 dólares para entrar no programa,
a maioria dos camponeses não entrou na iniciativa.
O atual enfoque político de redistribuição
de terras limita o desenvolvimento de diversas maneiras: concentra-se
recursos nas mãos de um pequeno número de produtores
comerciais negros, pouco propensos a gastar a renda disponível
na economia rural; confina a maioria dos camponeses à
dependência de salários nas fazendas e de relações
sociais paternalistas; restringe o impacto transformador da
reforma agrária a uma elite; atrasa o potencial efeito
da redistribuição, pois para comprar as terras
os camponeses devem assumir riscos econômicos e diversificar
suas fontes de sustento.
O Estado tem demonstrado falta de vontade política,
num discurso apenas jurídico, sem reconhecer a importância
da democratização econômica e social da
terra e o seu impacto na redução da pobreza
e no desenvolvimento econômico.
O
Movimento do Povo Sem Terra
O
que vigora hoje na África do Sul é o interesse
do governo na classe média "eficiente". O
governo está concentrando recursos nas mãos
de poucos produtores negros, levando a maioria pobre a relações
de trabalho tensas. É nesse momento que os sem terra
negros organizam o Movimento do Povo Sem Terra, demonstrando
a necessidade de realização de uma reforma agrária
popular.
O Movimento do Povo Sem Terra emergiu de uma violenta luta
contra o racismo. Ele representa a voz das massas que se mobilizam
para ter acesso à terra. É um movimento novo,
surgido em 2001, que rejeita o modelo de mercado de terras.
Tem promovido ocupações de terra, marchas e
ocupações de órgãos públicos,
com o objetivo de cessar as remoções forçadas
dos trabalhadores das fazendas. Tem como objetivo uma grande
campanha de ocupação de terras e são
enfáticos em dizer que para resolver o problema dos
sem terra na África é necessário resolver
o problema do racismo.
A participação popular, especialmente de mulheres
e jovens, no desenvolvimento deve ser um ato transformador.
Participação combinada à educação
transforma a consciência e leva a um processo de auto-estima,
permitindo às pessoas oprimidas assumir o controle
de suas vidas.
O acesso à terra fortalece a participação
dos camponeses no mercado de trabalho, além de contribuir
para o crescimento do emprego rural. A reforma agrária
também pode promover padrões mais igualitários
de crescimento, que transfiram renda e poder aos excluídos.
Texto
baseado em THWALA, Wellington D. - A Experiência
Sul-africana de Reforma Agrária
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