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Maria Luisa Mendonça

 

A difusão da ideia de “crescimento” esconde a vulnerabilidade das políticas econômicas e da dimensão da crise mundial na qual o Brasil está inserido
 
 Nos últimos anos, foi a criada a ilusão de que o Brasil estaria “imune” à crise econômica internacional e de que haveria uma contraposição de um modelo supostamente “desenvolvimentista” e de outro “neoliberal”. Porém, fica cada vez mais evidente que a dança das cadeiras entre medidas consideradas “neodesenvolvimentistas” e “neoliberais” encontra o limite da própria lógica do capitalismo global, que oscila entre recessão e inflação.
 
Este limite é próprio do atual momento de crise estrutural, caracterizado pela determinação do capital financeiro nos processos produtivos e pelo crescente poder de grandes monopólios privados sobre a produção econômica mundial. Estes fatores demonstram que, mesmo nos países centrais, a saída clássica para a crise através da industrialização (ou re-industrialização) não está colocada, e muito menos ocorre nos países periféricos.
 
O que presenciamos, tanto no centro quanto na periferia do capitalismo, é a alternância das mesmas receitas, que incluem basicamente três tipos de políticas: (1) Os Estados nacionais optam por mudanças nas taxas de câmbio e de juros, o que caracteriza o próprio Estado com agente financeiro, já que tais políticas estão atreladas à emissão de papéis nos mercados financeiros para financiar as dívidas internas dos países; (2) apropriação da renda da terra através da especulação imobiliária e do controle geopolítico de fontes de energia; (3) maior grau de transferência de mais valia acumulada pelo Estado para o capital privado, como nas chamadas “medidas de austeridade” ou de subsídios estatais e benefícios fiscais para grandes empresas.
 
O resultado é o entrelaçamento de “bolhas” financeiras e de infraestrutura, como ocorreu durante o colapso dos mercados imobiliários nos Estados Unidos e Europa. No Brasil, o governo aposta na criação de “bolhas” imobiliárias e de infraestrutura, que geram forte aumento do preço da terra, tanto no campo quanto nas cidades, além de mega projetos energéticos de barragens, petróleo e mineração. Outra prioridade tem sido facilitar o acesso a crédito, que gera maior endividamento dos trabalhadores. Ao mesmo tempo, o governo premia grandes empresas com isenção de impostos e altos subsídios.
 
Este tipo de medida pode ter efeito de gerar crescimento momentâneo, mas não previne a vulnerabilidade econômica e tampouco melhora o acesso da sociedade a direitos básicos. Muitos setores estratégicos da economia foram privatizados com financiamento público durante o período considerado “neoliberal”. Portanto, o Estado “mínimo” nunca existiu para o capital.
 
Tanto no período considerado “desenvolvimentista” quanto naquele chamado de “neoliberal” prevalece uma política estatal de apoio ao modelo agroexportador de monocultivos. É possível observar que os elementos que integram os períodos de expansão econômica coincidem com aqueles identificados como determinantes para gerar crise. Por exemplo, o crédito subsidiado que o governo concede ao agronegócio é utilizado para gerar especulação financeira, já que as empresas recebem financiamento a juros negativos e passam a atuar nos mercados de derivativos e de câmbio. Porém, o discurso sobre a suposta contribuição do agronegócio para gerar “equilíbrio” na balança comercial serve para garantir novos créditos, como no caso do Plano Safra de 2013 que concedeu R$146 bilhões ao agronegócio.
 
A ilusão da “produtividade” do agronegócio serve para justificar o avanço sobre terras indígenas e camponesas, apesar do próprio Censo agropecuário mostrar que os pequenos e médios agricultores produzem 70% dos alimentos no país. O lobby em favor da expansão de monocultivos resultou no desmonte do Código Florestal e pretende acabar com a demarcação de territórios indígenas. As mudanças na legislação ambiental permitem maior avanço do agronegócio principalmente em áreas com acesso a infraestrutura, vastas bacias hidrográficas e biodiversidade. Os efeitos serão desastrosos, pois é evidente que a destruição de fontes de água, rios e biodiversidade gera queda da produtividade agrícola.
 
O que ocorre no meio rural é o crescente controle de grandes empresas sobre a produção e comercialização agrícolas, simultaneamente a um processo de predominância do capital financeiro na agricultura, com o fortalecimento dos mercados de futuro e da especulação com commodities, que gera instabilidade nos preços dos alimentos. A lógica do agronegócio está baseada na superexploração do trabalho e da renda da terra. Entretanto, sua imagem como geradora de “desenvolvimento” serve de base ideológica para explicar a continuidade do apoio estatal para o latifúndio e para a intensificação do uso de agrotóxicos e insumos químicos na agricultura, que acabam por demandar mais recursos e diminuir a fertilidade do solo.
 
A difusão da ideia de “crescimento” esconde a vulnerabilidade das políticas econômicas e da dimensão da crise mundial na qual o Brasil está inserido. Por todo o mundo, o limite das políticas adotadas necessariamente gera protestos populares. É de se esperar que as mobilizações também se intensifiquem no Brasil e devemos nos preparar para fortalecer a denúncia e a resistência contra a repressão por parte do Estado e de milícias privadas, tanto no meio rural quanto urbano.
 
Maria Luisa Mendonça é jornalista e coordenadora da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos